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quarta-feira, 16 de junho de 2010

Brasília Urgente


Por Adailtom Alves

Mais de um milhar de militantes da cultura de todo o Brasil depositaram suas esperanças em Brasília nos dias 13 a 16 de dezembro, na I Conferência Nacional de Cultura (CNC). O sonho de todos é ver consolidado uma política de estado para a cultura brasileira.

O mote da CNC é “Estado e Sociedade Construindo Políticas Públicas de Cultura.” A sociedade, de fato, foi escutada, todas as diretrizes tiveram ampla participação da sociedade civil, o que esperamos é que não sejamos apenas ouvidos, mas sim que se crie o Plano Nacional de Cultura, já que as diretrizes são para nortearem a criação do mesmo.

A cultura precisa deixar de ser enfeite, penduricalho e deve ser tratada como vetor de desenvolvimento do Brasil. Queremos políticas públicas de cultura urgente, não para beneficiar artistas e fazedores de arte, mas sim para fazer valer o direito de todos os cidadãos brasileiros de forma a atingirem a verdadeira cidadania cultural.

Esperamos e lutaremos para que o próximo ano, que será ano eleitoral, os políticos não passem por cima da vontade de todos esses guerreiros que, na ânsia de verem um grande sonho realizado, deixaram seus compromissos de lado e foram a Brasília debater exaustivamente diretrizes fundamentais para a construção de políticas pública de cultura, que priorizem o ser humano e a cultura brasileira, em detrimento do mercado e do capital.

Senhores políticos cumpram o seu papel!

Publicado originalmente em 20/12/2005 no blog: http://adailtonalves.zip.net/

Ação cultural sim, fabricação não!

Por Adailtom Alves

No Brasil não temos ações culturais verdadeiras em nenhuma instância governamental, isso porque cultura não é prioritário no nosso país. Existem uns poucos programas públicos espalhados por algumas unidades federativas e alguns municípios, conquistados graças à organização e a luta da classe artística. Temos também ações educativas e fabricações de cultura. Tentarei ilustrar, do meu ponto de vista, o que são ações culturais ações educativas e cultura estatal ou fabricação de cultura.

Ação cultural é quando o estado fomenta, dar possibilidades para o artista criar, não sabendo e nem interferindo no processo. O estado confia ao artista o seu verdadeiro papel: o de criador. Os fazedores decidirão os meios artísticos e técnicos, não financeiros, de conduzir o processo, visando um fim. Neste processo também não cabe ao estado determinar qual e como será o fim. Cabe ao artista criador demarcar o seu trajeto, sempre com olhar crítico sobre o seu trabalho e a sociedade. O foco em uma ação cultural é o indivíduo, não um “produto”, mesmo que dessa ação sejam gerados “produtos”, como obras de arte. O indivíduo, o cidadão, o ser humano e, enfim, a sociedade é que será beneficiada com a ação cultural, sendo os programas públicos os meios, os artistas canais e os cidadãos o fim.

Na fabricação de cultura, o estado muitas vezes oferece condições materiais para a realização da arte, entretanto, dita as regras, interferindo no processo e dizendo o que espera de resultados. E mesmo quando não determina, só cria condições àqueles que os representa em suas obras. Ou seja, quem está na máquina estatal cria condições mais diz o que é e como deve ser a cultura.

Na ação educativa, o estado não fomenta, não cria condições e passa a dizer o que entende por cultura sob a égide de que “é preciso capacitar” ou do falso discurso de “é preciso que todos tenham acesso”, inventa-se um monte de oficinas e os professores das artes em geral, passam a representar a estrutura estatal e os que estão no poder e, em nome dos mesmos, passam a dizer o que é cultura. O acesso é falso, pois o artista não tem as reais condições de criar sua arte e desenvolver sua poética e fica a mercê do estado não podendo produzir e ainda joga centenas no mercado – que não existe – com o discurso da inclusão. A ação educativa PODE e DEVE fazer parte da ação cultural, mas não pode ser um fim em si.

Concluindo é preciso tratar a cultura como algo sério e criar políticas de estado sérias que darão condições para o verdadeiro desenvolvimento cultural; sabendo que o retorno de uma ação cultural será lento, mas muito vantajoso para qualquer sociedade.


Publicado originalmente em 09/01/2006 no blog: http://adailtonalves.zip.net 

terça-feira, 8 de junho de 2010

UM BREVE RELATO: AMARCORD

Ao meu palhaço de nome Zé...
Bozélis do meu coração,
Quem me ensinou que o que faço,
Vem de onde eu vim,
Misturado como eu vivo
E vejo, o onde estou.

Quando, há quase 20 anos, o CLOWN surgiu em minha vida, apontando para um novo caminho de interpretar, de fazer teatro, não tinha se quer a dimensão de onde chegaria.
Primeiro, o encontro comigo mesma e a simples aceitação de quem eu era, das minhas origens, da minha história; segundo,colocou-me em choque com as minhas certezas acadêmicas; terceiro, o reencontro, através da minha mais pura intuição, com o teatro que se faz pelo puro prazer de fazê-lo; Por último, a certeza intuitiva de que deveria passar para o outro lado do palco para poder realizar algumas idéias que surgiam.
Nas minhas tentativas de voltar ao palco como atriz não consegui expressar esse "jeito" de interpretar e de fazer teatro. Frustrei-me. Solitário demais. Ao mesmo tempo estando à frente de um espetáculo, dirigindo outros atores, sempre as mesmas inquietações e a necessidade de entender, classificar e rotular o meu trabalho.
Só sei que depois que a LINGUAGEM CLOWNESCA apareceu em minha vida não pude mais abandonar-me de mim mesma. Melhor, ABANDONEI-ME A MIM MESMA: à minha origem, à minha insensatez, às minhas incertezas, ao meu caminho sempre ao revés da maré; às minhas pequenas verdades cotidianas, poéticas, oníricas! Sempre estive do outro lado da margem...
Tenho tentado viver uma vida, no mais possível, vizinha daquilo que fui, que carrego dentro de mim enquanto herança cultural e ancestral. Tenho buscado incessantemente esse ser "essencial" do qual me afastei.
Tenho tentado expressar a minha solidão através de uma idéia de coletivo que talvez nunca poderei alcançar. Talvez o meu caminhar venha a explicar um estilo, um jeito, uma maneira de fazer a arte que faço.
Pergunto-me o que aconteceu nas grandes cidades com as manifestações folclóricas? os folguedos? as folias? os reisados? E como fazer o registro contemporâneo desses tipos que fazem parte da nossa cultura popular? Como revelar a nossa própria história relegada ao esquecimento, que se perdeu no anonimato das distâncias de outrora e que os pequenos personagens da vida cotidiana e urbana, geralmente oriundos de pequenos centros ou do interior, trazem para próximo de todos nós? Eles apontam criativamente, o estabelecimento de novos tempos: marreteiros, camelôs, mascateiros, caixeiros viajantes, ambulantes etc.
Talvez minha insistência em continuar trabalhando com essa linguagem, a do clown, da maneira como trabalho, seja a tentativa de não ver morrer na grande metrópole, esses artistas, esses personagens que migraram, com sua sabedoria e suas manifestações para a cidade grande.
Foi a esse caminho sem volta que o clown me levou.
Procuro organizar uma pedagogia para esse ator popular brasileiro, a partir de uma experiência pedagógica similar a que é desenvolvida no L.E.M. (Laboratório de Estudo do Movimento), de Jacques Lecoq, em Paris. Penso e vislumbro uma possibilidade de formação de um artista que leve em consideração uma tradição para poder fazer dela um ponto de partida para novas descobertas e propostas.
Fundei o Clã – Estúdio das artes Cômicas, local onde nossa arte é ensinada e aprendida, que tem seu trabalho voltado para a formação de artistas cômicos, tendo como foco o PALHAÇO, AS MÁSCARAS DA COMÉDIA E A LINGUAGEM CORPORAL E GESTUAL (técnicas circenses, mímica, pantomima, danças brasileiras etc.).
No Clã, produzimos, experimentamos e ensinamos. Nos propomos a uma formação de artistas dentro da linguagem do palhaço; artistas palhaços que possam seguir rumos dos mais diversos: O PICADEIRO, A RUA, O TEATRO, O HOSPITAL, O ASSISTÊNCIAL, AS FESTAS E EVENTOS. Busca essencialmente a verdade deste intérprete, sua formação técnica e ética, sua identidade cultural, artística e que ele possa encontrar o melhor caminho para o pleno êxito de sua profissão. Estamos criando uma identidade através da busca do intérprete BRASILEIRO.
Por isso mantenho o uso da palavra clown e não palhaço, porque clown em inglês, vem de CLOD. Literalmente, torrão da terra, o camponês, rústico, presentes em nossos DRAMAS CIRCENSES com os caipiras, os sertanejos. Como nossos grandes intérpretes cômicos SEBASTIÃO ARRUDA e AMÁCIO MAZZAROPI, para citarmos apenas dois exemplos ilustres.
No Clã, estamos experimentando um caminho no intuito de preparar esses intérpretes populares, essa linhagem tipicamente brasileira, que tem se perdido juntamente com o desaparecimento das lonas e da tradição circense. Buscamos criar nosso jeito de fazer teatro.
É assim que busco fazer meu teatro, meu circo-teatro.
Dizem que "a imaginação do povo, com suas maneiras peculiares de expressão, é que espalha na terra os encantos, as ilusões e as virtudes". Assim é. E assim seja!
E como diria meu ilustre conterrâneo Caetano Veloso... OU NÃO?!
Cida Almeida
Professora de clown e fundadora do Estúdio Clã


São Paulo – 21/12 /2006 Publicado originalmente em A Gargalhada