São Caetano do Sul, 30 de janeiro de 2024.
Carta ao Excelentíssimo Secretário de Cultura e à Excelentíssima Secretária de Educação de São Caetano do Sul
"A arte ajuda a criar um ensino ativo"
Ana Mae Barbosa
O Fórum de Cultura da Cidade de São Caetano do Sul, agregador de trabalhadoras e trabalhadores da cultura, artistas e arte educadoras(es) da cidade, fundado em 22 de janeiro, de 2024, vem por meio desta, manifestar sua indignação perante o EDITAL Nº 30/2023-SECULT/SEEDUC - DE CHAMAMENTO PÚBLICO PARA CREDENCIAMENTO DE PROFISSIONAIS PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS JUNTO À SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE SÃO CAETANO DO SUL NO PROGRAMA SÃO CAETANO INTEGRAL. (Lei n.º 6.170 de 14 de dezembro de 2023).
O referido edital, apresentado pela Secretaria de Educação em parceria da Secretaria de Cultura, cria um programa que a exime de chamar os professores de arte aprovados no último concurso de 2023 e que já estão no aguardo de suas vagas. Ao contrário, ao se contratar temporariamente oficineiros para substituírem os professores de Arte, a Secretaria de Educação cria um posto de trabalho precarizado, sem nenhuma seguridade trabalhista, com um salário abaixo do piso salarial e abrindo a possibilidade de contratação de um profissional com “até” 3 anos de experiência, sem a necessidade de formação em Licenciatura na área.
Segue abaixo os detalhes pelos quais consideramos esse Programa um desrespeito ao profissional de Arte e/ ou estudantes, bem como uma ação de precarização do ensino público.
Segundo o edital, os profissionais receberão por uma carga horária de 25 horas semanais nas seguintes funções:
Coordenadores: dois salários-mínimos nacional vigente R$2.824,00 (dois mil, oitocentos e vinte e quatro reais) mensais.
Arte-educadores: um salário-mínimo nacional vigente R$1.412,00 (mil e quatrocentos e doze reais) mensais.
Essa oferta salarial é pelo menos 3 vezes menor quando comparado com o professor de arte devidamente concursado na rede. Nesse contexto, esse profissional não participará das reuniões de HTPC (Horário de Trabalho Coletivo) e diminui a possibilidade de realizar trabalho pedagógico vinculado ao currículo da cidade, pois não haverá tempo remunerado de estudo e diálogo no espaço escolar. Além disso, não terão férias, nem 13° salário, nem mesmo gratificações.
No dia 22.01.2024, o Secretário de Cultura, Erike Busoni, publicou em suas redes sociais um discurso defendendo que o EDITAL Nº 30/2023, da SECULT e SEEDUC possui o intuito de contribuir com empregos para estudantes de cursos técnicos em linguagens artísticas, como os da Instituição Fundação das Artes. Como se realizasse uma benfeitoria, no caso, o primeiro emprego de um(a) jovem artista, submete esta(e) trabalhadora em período de formação à hora aula no valor de 7 reais. A afirmação do Secretário gerou na categoria da cidade três reflexões: 1) Um curso técnico de teatro, artes visuais, música ou dança possui disciplinas direcionadas aos estudos de metodologias, didáticas, possíveis pedagogias e ou estudos voltados à relação professora(o) aluna(o), conhecimento cognitivo a partir da faixa etária e questões sócio-educativas - estudos esses que fariam tratar a educação de uma crianças com total responsabilidade? 2) Este curso, voltado à profissionalização técnica de atrizes/atores e/ou musicistas, prepara um jovem artista para a Arte Educação e capacita-o para atender sozinho por volta de 25 a 30 crianças em uma sala de aula? Seria o curso técnico um ensino direcionado à carreira profissional de atriz/ator, artista visual, dançarina/o ou de arte-educador? Pelo fato de não solicitar licenciatura para trabalhar com crianças em processo de aprendizagem, o referido edital descaracteriza a profissionalização de professora(e)s de artes e também de arte educadoras(es) e pesquisadora(e)s da área Arte Educação. Estes últimos profissionais citados também costumam exercer funções em oficinas de cunho não formal, complementar à escola, como é o caso de programas modelos e/ou parecidos com o novo edital Credenciamento de Profissionais junto à Secretaria de Educação e Cultura de São Caetano do Sul, como o Programa Tempo de Escola, em São Bernardo do Campo (realizado entre os anos de 2015 e 2016) e PIÁ e PIAPI, em São Paulo, que seguem vigentes, cada vez mais qualificados e em busca de aperfeiçoamentos, em diálogo com os artistas-educadores e orientadores.
Em 2023 foi aberto o concurso público com pouquíssimas vagas para as Artes, o que parecia incoerente diante de tantas necessidades e das novas vagas que se abriram, uma vez que todas as escolas da cidade iriam se tornar escola de tempo integral no ano de 2024. No entanto, com o lançamento deste edital fica explícito o movimento que aponta para uma redução de verba destinada à educação injustificável, tendo em vista o repasse de recursos públicos oriundos do governo federal para a implantação das escolas em tempo integral nos municípios que firmaram esse convênio, como é o caso de São Caetano do Sul. Em síntese, é possível identificar que os recursos chegaram à prefeitura, mas a aplicação não foi realizada plenamente, tendo em vista o não chamamento das professoras e dos professores aprovados em concurso e o lançamento do referido edital que lança profissionais em um cenário de evidente precarização. Além disso, aponta para um entendimento do componente Arte como uma disciplina acessória, de valor menor, que pode ter profissionais mal remunerados, em condições trabalhistas precárias e sem nenhuma participação do tão falado “plano de carreira”.
Esta tentativa de economia de dinheiro às custas da precarização dos direitos trabalhistas da professora(or) de Arte nos leva a entender o programa com “ilegal”, pois fere os direitos trabalhistas, concebe as disciplinas de arte como acessórias e de menor importância e ainda admite um profissional para ministrar aulas na escola sem a necessidade de ter um curso de licenciatura como formação.
Sabemos inclusive que este edital não é uma ação isolada na cidade no que diz respeito aos desmontes na área da arte educação realizados pela Secretaria de Educação. Infelizmente, desde o ano passado foi reduzida drasticamente a carga horária das linguagens artísticas na matriz curricular das escolas de tempo integral. Esse ano mais uma nova redução ocorreu. Essas ações já estavam apontando para o desfecho atual.
São muitos retrocessos para a Arte educação da cidade, que colaboram para uma queda na qualidade de ensino, pois quando oferecemos atividades com profissionais em condições precárias de contratação e de vínculo institucional, não temos educadoras(es) amparados e estruturados para realizar amplamente suas propostas pedagógicas.
Diante dos absurdos que relatamos acima, pedimos pela revogação deste edital, e que sua problematização seja devidamente dialogada, em reunião a combinar, com a categoria artística, arte educadores, sociedade civil, mães, pais e comunidade escolar. Pedimos também a revogação das alterações na matriz curricular das escolas de tempo integral do ano passado e retrasado, para que a arte tenha seu lugar garantido no desenvolvimento de nossos estudantes.
Por fim, também requeremos que os programas e políticas públicas voltadas aos artistas da cidade sejam realizados de forma a de fato fomentar e valorizar a arte e a cultura no município e que isso seja feito a partir de remunerações justas e relações de trabalho não precarizadas.
Sem mais,
Assinam esta carta:
Fórum de Cultura da Cidade de São Caetano do Sul
Coletivo Tear - Coletivo de arte educadores do município de São Caetano do Sul
Rede Brasileira de Teatro de Rua e seus 140 grupos de teatro, sediados em todo território nacional.
OPAE - Organização Paulista de Arte Educação
Integrantes e Participantes da OPAE:
Ana Carmen Nogueira
Mirian Celeste Martins
Roberta Jorge Luz
Rosa Iavelberg
José Minerini Neto
Lucimar Bello Pereira Frange
Edson Elidio Adão
Luciana Andréa Nunes de Magalhães
Maria Edite Horta
Isac dos Santos Pereira
César Augusto dos Santos Carvalho - Guto Carvalho
Bruna Fernanda Gomes Carvalho
Ana Marcia Akaui Moreira
Pio de Sousa Santana
Márcia Campos dos Santos
Lelê Ancona (Alessandra Ancona de Faria)
Rubens de Souza
Mirian Steinberg
Tarcila Lima da Costa
Fernanda Eiras Rubio
Eliane Aparecida Andreoli
Maria Christina de Souza Lima Rizzi
Rodrigo Andrian de Aguiar
Mirca Izabel Bonano
Elisângela de Freitas Mathias
Laura Helena Jamelli de Almeida
Maria Cristina Blanco
Eliana Angélica Peres D'Alessandro
Liciane Ketty da Silva Braz
Rita de Cássia Demarchi
Maria de Lourdes Sousa Fabro
Lilian do Amaral Nunes
Ariene Alves Dupin
Silvana Rodrigues Montemor Mollo
Renata Fantinati Corrêa
Eliana de Fátima Fernandes
Lilian Freitas Vilela
Débora Rosa da Silva
Kathya Maria Ayres de Godoy
Maria Filippa da Costa Jorge
Michelle dos Santos Lomba
Rodrigo Gonçalves de Abreu
Drieli Caroline Gaona
Simone Leal dos Santos Abreu
Luís Gustavo Luz
Vanessa de Oliveira Silva
Sonia Leni Chamon
Inaê Coutinho de Carvalho
Eliane Patrícia Grandini Serrano