Pesquisar este blog

sábado, 25 de abril de 2015

Carta ao Ministro Juca Ferreira

Brasília, 16 de abril de 2015

Ilmo Ministro de Estado da Cultura do Brasil
Juca Ferreira

Nós, da Frente Nacional de Teatro, constituída por coletivos teatrais de trabalho e pesquisa continuados; Federações, Cooperativas e Redes de Teatro, oriundos de 16 unidades federativas de todas as regiões do Brasil, presentes nesta plenária, manifestamos o seguinte:

A Luta do Teatro de Grupo por políticas de Estado, públicas e democráticas, para o teatro brasileiro é histórica. Iniciada em 1990 pelo Movimento Brasileiro de Teatro de Grupo, passando pelo Movimento Arte Contra a Barbárie, Rede Brasileira de Espaços de Compartilhamento Pesquisa e Criação Teatral – Redemoinho, Rede Brasileira de Teatro de Rua, Congresso Brasileiro de Teatro, entre outros, construiu, assim, um acúmulo de proposições para que nossa produção seja reconhecida de fato e de direito.

Em 2015, uma das bandeiras desta luta completa 10 anos: a Lei de fomento para o Teatro Brasileiro, concretizada através do projeto de Lei Prêmio do Teatro Brasileiro. Esta pauta  converge reinvindicações do Teatro de Norte a Sul do Brasil e nunca foi tão urgente como neste momento. Seja pelo histórico desmonte da FUNARTE e também histórica distorção criada por editais como o Prêmio Myriam Muniz, que separa o Brasil, definindo, preconceituosamente e sem critérios claros, valores de montagem díspares para diferentes regiões; seja pelo urgente alinhamento com as metas do Plano Nacional de Cultura a fim de que, de uma vez por todas, o Estado reconheça o lugar das artes como gerador de riqueza material e simbólica e não como simples demandatário de investimento.

A Lei “Prêmio do Teatro Brasileiro – Programa Nacional de Fomento ao Teatro” deseja estabelecer um patamar mínimo que dê suporte para a manutenção do trabalho de Artistas, Técnicos e Coletivos Teatrais de todo o Brasil, através de uma política de Estado, que objetive efetivamente  a superação da instabilidade e fragilidade dos editais controlados pelo governo federal.

A continuidade da pesquisa, montagem, circulação e fruição de trabalhos artísticos garantida em Lei, corrige, em parte, a falha histórica do cumprimento do dever constitucional de dar acesso aos fazeres e saberes culturais do e para o povo brasileiro.

Claro que nossa pauta é mais extensa, levanta questões trabalhistas, previdenciárias, educacionais; reforça a importância dos colegiados setoriais e o poder consultivo e deliberativo do Conselho Nacional de Políticas Culturais e reitera a importância da formação de uma comissão nacional, com participação paritária da sociedade civil organizada, no intuito de debater e avaliar as ações da FUNARTE que, nos últimos anos, pouco dialogou com as políticas mais transformadoras do MINC - Cultura Viva, Mais Cultura, Vale-cultura - e que, portanto, precisa ser radicalmente repensada. Ressaltamos que, no ano em que o MINC completa 30 anos e tem um dos menores orçamentos da sua história, torna-se inadiável a aprovação da PEC 150.

Esta Frente Nacional de Teatro soma-se em defesa da Cultura brasileira e reitera a necessidade da efetivação do “Prêmio do Teatro Brasileiro – Programa Nacional de Fomento ao Teatro” e solicita a construção de uma agenda sistemática com o Ministério da Cultura a iniciar-se ainda neste primeiro semestre.

Na certeza de que o senhor Ministro encaminhará com urgencia as demandas desta Frente Nacional de Teatro, agradecemos em nome de todos os companheiros, em especial destes 40 representantes de coletivos, federações, cooperativas e redes de todas as regiões do Brasil, que custearam com recursos próprios suas vindas de lugares os mais distantes, para reafirmar a importância histórica desta reunião de 16 de abril de 2015 – coincidencia ou não, dia mundial da voz.



Frente Nacional de Teatro

sábado, 4 de abril de 2015

A força do teatro



Adailtom Alves Teixeira[1]

De 21 a 28 de março ocorreu em Rio Branco/AC, o VII Festac – Festival de Teatro do Acre, realizado pela Federação de Teatro do Acre (FETAC). Os números impressionam. Na programação 29 apresentações dos 14 grupos de diversas partes do Brasil e dos 8 grupos locais, que ocuparam 5 espaços: Teatro Plácido de Castro, Usina de Arte, Novo Mercado Velho, um shopping e o abrigo onde estavam os atingidos pela cheia. Além disso, debates, trocas de experiências e vivências artísticas todos os dias.
Os espetáculos compuseram um grande painel, uma bela colcha de retalhos do teatro brasileiro realizado na atualidade. Foram apresentações musicais, mamulengos, farsas, palhaços, épicos, entre outros.

O Festival iniciou da mesma maneira que se originou o teatro: no dia 21 às 16:50h na Praça da Revolução, seguindo em cortejo pela Av. Getúlio Vargas até o Novo Mercado Velho. Todos os artistas que estavam na programação acompanharam o cortejo. Ao lado do Rio Acre, em frente ao Mercado, ocorreu a apresentação da Cia. Visse Versa com o espetáculo As mulheres de Molière. Como afirmou Dinho, integrante da FETAC, “Dioniso é nosso amigo”, afinal em tempos de chuvas o sol contribuiu e estava esplendoroso. O Festival começou na rua, integrando todos e todas, sem distinção de qualquer espécie.
Porto Velho participou do Festival com dois espetáculos: Nove luas (Cia. Fiasco) e Mulheres de Aluá (O Imaginário). Em ambos a temática da mulher, abordado de forma muito distintos. Poderia se escrever muito sobre ambos, mas um exemplo simples para ilustrar as distinções: o primeiro é um espetáculo mudo e parte da lendo do boto; o segundo, usa a dramaturgia textual e tem a pesquisa calcada em autos judiciais. A violência contra a mulher está presente nos dois, mas buscam resoluções cênicas para o problema, muito diferentes. É certo que a violência contra a mulher ainda gerará outros espetáculos, afinal Porto Velho continua sendo a capital recordista de violência ao gênero feminino.

O teatro é uma maneira de refletirmos sobre a vida, sobre a sociedade, sobre o mundo e todas as nossas relações. Por isso mesmo é uma arte viva. O Acre e, especialmente, Rio Branco passam por momentos difíceis por conta da cheia do rio, desabrigando muitas pessoas. Por conta disso, o Festival teve muitos cortes de recursos, mas ainda assim a FETAC optou por manter toda a programação e continuar com o Festival, uma maneira de presentear a população acreana, de mostrar a força desse povo, bem como a força do teatro.
A população acreana abraçou o Festival numa clara demonstração de que a arte é fundamental para a vida e para o nosso tempo. Em sendo o teatro a arte do encontro, pois é feito por pessoas e para pessoas e só ocorre no momento de sua apresentação, que o encontro proporcionado em Rio Branco possa perdurar e alimentar outros tantos que por aí já existem ou tantos outros que venham a existir. Vida longa ao Festival de Teatro do Acre.



[1] Mestre em Artes; professor de teatro na Unir.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Hoje tem espetáculo? Tem, sim, senhor!


Adailtom Alves Teixeira[1]

A arte que se coloca na rua, em geral, faz do transeunte um apreciador de obras. No caso do teatro, os artistas que se colocam nesse espaço precisam apreender seus códigos, sob pena de serem devorados, engolidos, como costuma falar seus praticantes. Nesse sentido, o aquecimento de público ou aquecimento da roda é um dos pontos mais importantes. Dessa forma, os momentos que antecedem o espetáculo é primordial, sobretudo aqueles em que a participação do público se faz necessária.
Fotos: Selma Pavanelli

Nesse quesito o coletivo Circo Teatro Rosa dos Ventos, de Presidente Prudente, são muito experientes. Dentro de um esquema do morde e assopra, isto é, um palhaço rebaixa e outro desfaz a brincadeira com o público e entre si. Fazem da rua o quintal de casa ou mesmo a sala de estar, na qual o público vai ficando mais que a vontade, vai se sentindo pertencente àquele universo. A saber: ao mundo do circo.
Osasco, calçadão, em frente ao shopping center, na região central. Fim de tarde, pouco mais de cinco horas. Intenso movimento de pessoas em um ir e vir constante, seja na direção das compras ou retornando às suas casas após o trabalho e se deparam com o circo montado. Na verdade, uma simples empanada, uma pequena lona no chão em forma de picadeiro, o espaço da banda. Pronto. O circo está montado.

Calcado em reprises e esquetes cômicas o espetáculo agrada adultos e crianças. A diferença entre reprise e esquete, é que a reprise, tradicionalmente faz piada de um número sério apresentado no circo. Foram duas as reprises apresentadas pelo Rosas dos Ventos: a do número de facas, que encerra o espetáculo, no qual público e artistas se cumpliciam na realização do mesmo, e da levitação com bancos. As reprises/entradas são as também tradicionais do cumprimento e do malabarismo.
Cabe ainda dois destaques do espetáculo: o multi-instrumentista Nicochina (Robson Toma) que impressiona pelo trabalho, ao criar e executar toda a música e os sons incidentais ao vivo. O artista cria, arranja e executa, tocando bateria, guitarra, teclado e outros instrumentos (alguns inventados por ele). Sem dúvida o espetáculo tem um grande ganho com sua presença.
Outro destaque é a utilização da estética do grotesco presente no corpo dos palhaços (baixo corporal) e na utilização de duplos sentidos. O grotesco é fundamental na comicidade popular e, apesar de ter sido o primeiro espetáculo criado pelo grupo (2001), o coletivo de palhaços aplica muito bem essa estética. Não se sabe se foram aperfeiçoando ou já nasceu com essa força grotesca. A verborragia, tão comum no palhaço brasileiro, também está presente, sobretudo nos sentidos dúbios.
A apresentação de Hoje tem espetáculo!!! ocorreu em Osasco dia 02 de abril, dentro do Projeto Rosa dos Ventos 15 Anos, contemplado pelo ProAC, da Secretaria de Cultura do Estado e contou com a parceria local do Teatro dos Ventos e da Secretaria Municipal de Cultura de Osasco. O projeto contemplará ao todo, com a circulação do espetáculo, 10 cidades do estado de São Paulo. As próximas apresentações ocorrerão no dia 10 (Santos) e 12 de abril (Ribeirão Preto). Quem tiver a oportunidade, acompanhe, pois a gargalhada estará garantida. Afinal, mais de 400 pessoas se divertiram na tarde do dia 02 de abril na cidade de Osasco. 
Por fim, cabe registrar que o espetáculo é uma criação coletiva dos artistas Fernando Ávila, Gabriel Mungo, Luís Valente, Robson Toma e Tiago Munhoz, todos integrantes do Circo Teatro Rosa dos Ventos.




[1] Mestre em Artes pelo IA/UNESP; professor de teatro da Universidade Federal de Rondônia; ator, diretor e pesquisador de teatro de rua.