Luiz Carlos Checchia - Doutor em Humanidades pela FFLCH/USP. luiz.checchia@gmail.com
"Todo povo
tem na sua evolução, vista à distância, um certo 'sentido'. Este se percebe não
nos pormenores de sua história, mas no conjunto dos fatos e acontecimentos
essenciais que a constituem num largo período de tempo. Quem observa aquele
conjunto, desbastando-o do cipoal de incidentes secundários que o acompanham
sempre e o fazem muitas vezes confuso e incompreensível, não deixará de perceber
que ele se forma de uma linha mestra e ininterrupta de acontecimentos que se
sucedem em ordem rigorosa, e dirigida sempre numa determinada direção."
Caio Prado Júnior
“A
obra principal do fascismo é o aperfeiçoamento e organização do sistema
ferroviário. Os comboios agora andam bem e chegam sempre à tabela. Por exemplo,
você vive em Milão; seu pai vive em Roma. Os fascistas matam seu pai, mas você
tem a certeza que, metendo-se no comboio, chega a tempo para o enterro.”
Fernando Pessoa
1. UMA RÁPIDA E NECESSÁRIA INTRODUÇÃO
Por fascismo
entendemos uma forma-política, ou seja, uma organização política
historicamente formada que passa a existir como prática possível enquanto
estiverem presentes as condições objetivas e subjetivas para tal. Nesses
termos, uma forma-política, mesmo que ainda não materializada, é uma
possibilidade real, como é o socialismo para as sociedades capitalistas. Também
precisamos considerar que como uma forma-política, ainda que superada
por outra, pode ressurgir caso as condições para sua existência não sejam
eliminadas por completo, sendo a reversão capitalista que pôs fim à União
Soviética seu melhor exemplo. Entendemos, assim, que o fascismo é uma forma-política
possível ao capitalismo, que surge dos setores mais reacionários da
pequena-burguesia quando conseguem expressar-se politicamente (POULANTZAS, 1972
e 1975). Nem sempre essa classe consegue expressar suas expectativas
políticas, pois desde o alvorecer da modernidade até a consolidação do
imperialismo a história da pequena-burguesia é a história de seu
enfraquecimento econômico e político. Enquanto perdia a relevância social, ela
ainda assistiu ao crescimento das duas principais classes do capitalismo, a
burguesia e a trabalhadora; e pior ainda, via-se cada vez mais submetida e
condicionada por elas.
No entanto, a pequena
burguesia pode apresentar-se como alternativa política quando as crises, comuns
ao capitalismo, eclodem de forma aguda e acirram os antagonismos de classes,
enfraquecendo, mesmo que momentaneamente, as demais classes e seus
representantes políticos. E quando emerge politicamente, os setores
reacionários da pequena-burguesia o fazem carregados de ressentimentos,
regressões e contradições; o fascismo é uma das formas como podem se apresentar
para a sociedade. Mas essa emergência do fascismo não segue sempre o mesmo
figurino: os impactos das crises em cada nação, a conformação de suas classes,
seus arranjos políticos, seus arcabouços culturais e suas composições
societárias vão determinar as particularidades com que o emergirá, se de fato
tais setores conseguirem se colocar politicamente. Esses são os contextos
políticos em que, genericamente, emergiram o nazismo na Alemanha e o
fascismo na Itália, conforme analisado por Poulantzas e que aqui denominamos de
situação-fascista. E que nos parecem ser situações recorrentes e
comuns às emergências fascistas posteriores àquelas primeiras
experiências ocorridas nos anos de 1920 e 1930.
Sendo o fascismo uma forma-política
que se materializa em experiências particulares, podemos falar então em forma-fascismo,
entendendo esse termo com a generalização que explica cada uma de suas
ocorrências históricas. E cada uma delas só é possível quando um complexo de
situações torna possível a sua emergência: não haveria nazismo se um conjunto
de iniciativas e eventos, alguns planejados e outros acidentais não houvesse
ocorrido na Alemanha. Pensando assim, percebemos a dialética entre os grandes
desenvolvimentos estruturais do capitalismo imperialista, sem as quais as
experiências fascistas não teriam ocorrido, e os eventos particulares em cada
país e época que levam à sua efetivação. Dessa maneira, acreditamos escapar da
arapuca simplista comum a muitas análises que concluem que o fascismo é fruto
unicamente do imperialismo, quase como um desdobramento mecânico dele e
desprezando especificidades históricas, culturais e políticas; e, doutro lado,
escapamos daquelas análises que se prendem tão somente às explicações
particulares e terminam por tornarem-se cegas ao amplo espectro da luta de
classes em nível geopolítico.
Se essa formulação
estiver correta, como acreditamos que esteja, pensamos que acontecimentos
recentes formaram em nosso país uma situação-fascista. Acontecimentos
domésticos e geopolíticos promovidos a partir de um conjunto de fatores, tais
como: a crise do capitalismo que eclode em 2008; mudanças nas políticas
econômicas da China; a descoberta do pré-sal e o desenvolvimento de tecnologias
para sua extração por parte da Petrobras; o fortalecimento de associações
transnacionais contra-hegemônicas, como os BRICS e outros mais. Esse contexto
intensificou as disputas políticas internas do país, e setores reacionários que
haviam estabelecido acordos com o Partido dos Trabalhadores passaram a operar
no sentido de tomarem o governo de assalto, sendo a expressão “com o supremo e
tudo” sua melhor ilustração. É interessante notar como a parte da burguesia que
tradicionalmente é o carro chefe da dominação de classe no país (MARTINS, 1975 e
2017; FERNANDES, 1972 e 2015), tendo sua representação política mais acabada no
Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), é posto na situação de
coadjuvante do processo. Do assalto ao governo, que se configura na deposição
da presidenta Dilma Rousseff, chegou-se à eleição do atual presidente da
república.
Isso posto,
esclarecemos que o presente artigo apresenta um ligeiro esboço da situação-fascista
que favoreceu a emergência da forma-fascismo no Brasil atual, que
podemos designar de bolsonarismo. Essa situação é formada por um
complexo de fatores que vão desde o lugar do Brasil no contexto da disputa
geopolítica até a atualidade da luta de classes no país. Dessa maneira,
esperamos prestar, ainda que pequena, uma contribuição à formulação de uma teoria
do fascismo e aplicá-la para a compreensão de nosso momento histórico. Isso
posto, o presente artigo faz uma descrição da situação que possibilitou a
emergência da forma-fascismo bolsonarista.
2. A FORMAÇÃO DA SITUAÇÃO-FASCISTA
BOLSONARISTA
Um conjunto de
fatores históricos-políticos concorrem para a formação da situação-fascista que
foi favorável à emergência do bolsonarismo. São muitos e distintos entre si, de
diferentes temporalidades e intensidades. Talvez, em outras ocasiões e contextos,
estivessem longe de constituírem um contexto de emergência fascista, mas sua
combinação no momento histórico em que ocorreram, foram determinantes para o
fortalecimento da pequena-burguesia e sua agenda fascista. Neste artigo,
destacamos seis desses fatores que nos parecerem serem os mais importantes e
decisivos, sendo eles: a nossa tradição nazifascista; o paroquialismo da nossa
política nacional; o contexto geopolítico (sobretudo a partir da eleição de
Barack Obama); os grandes atos de 2013; a deposição da presidenta Dilma
Rousseff; e, por fim, os desdobramentos da Operação Lava Jato. Evidentemente
que muitos outros fatores ficam de fora dessa lista, mas cremos que esses
quatro já nos apresentam um panorama abrangente e suficiente para compreender
nossa atualidade política. Destacamos que não estamos defendendo que a
combinação desses fatores resultando numa situação-fascista tenha sido
planejada por alguém ou algum grupo político. Mas sim que esses eventos,
iniciados em diferentes tempos, carregados de diferentes motivações e levados
por sujeitos diversos e concorrentes acabaram levando a uma síntese histórica
condicionada pelas especificidades da luta de classes em nosso país e suas
relações com a luta de classes em escala geopolítica.
Nossa tradição nazifascista
Antes mesmo de
ascensão de Hitler ao governo alemão já havia no Brasil células do Partido
Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, como ocorreu em Blumenau, no
Estado de Santa Catarina, como escreveu o pesquisador João Henrique Zanelatto,
em seu artigo O Nazismo e o Integralismo em Santa Catarina. A pesquisadora
Ana Maria Dietrich, que doutorou-se com a tese Nazismo tropical? O Partido
nazista no Brasil, aponta que o partido nazista “[...] se instalou e funcionou por dez anos no
Brasil, atuando em 17 Estados brasileiros, com 2.900 integrantes. Também em
função das “boas relações de amizade” entre os dois governos, alemão e
brasileiro, que resultou na assinatura de diversos tratados comerciais e na
esfera política, da caça aos comunistas e treinamento de policiais brasileiros
pela GESTAPO” (DIETRICH, 2007, p. 26). Também a história da
presença do fascismo italiano no Brasil é de primeira hora; com significativas
colônias italianas, o país esteve dentre aqueles que receberam as políticas
implementadas por Mussolini para os imigrantes que se adaptavam a cada situação
e local, considerando suas realidades locais e interesses estratégicos. Dela
faziam parte os fasci all’estero “[...] as seções do Partito Nazionale Fascista (PNF) implantadas no exterior
para atingir as coletividades italianas emigradas e difundir a ideologia
fascista” (BERTONHA, 2008, p. 72).
Todavia, a história
do fascismo no Brasil não se resume apenas às presenças de seus representantes
alemães e italianos; logo nos anos de 1920 organizações autóctones se formam no
país e passaram a disputar a hegemonia do movimento fascista em nosso país
(BARBOSA, 2015). O movimento acabou sendo hegemonizado pela Ação Integralista
Brasileira (AIB), fundada oficialmente em 1932, por Plínio Salgado, e que foi
certamente “[...] o mais
representativo das experiências políticas portadoras de ideologias autocráticas
chauvinistas na América do Sul na primeira metade do século XX”
(BARBOSA, 2015, p. 72). A AIB contava com uma capilarizada rede social e
assistencial, como mostra o documentário Soldado de Deus, de Sérgio Sanz. A disputa pela
hegemonia do movimento fascista no Brasil ocorreu também entre integralistas e
aqueles que defendiam e professavam o fascismo italiano (BERTONHA, 2015, p.
129). A doutrina integralista nunca deixou a cena política nacional, ainda que
esteja reduzida a pequenos grupos espalhados pelo país e nas redes sociais.
Também o nazismo campeia em nosso país desde suas primeiras horas.
A tradição
nazifascista brasileira não se restringe às experiências no início do século,
em artigo que publicamos para o portal a Terra é Redonda, intitulado Fascismo,
não é só na Ucrânia, abordamos diversos momentos dessa tradição, mas
destacamos aqui suas expressões mais recentes e que infestam as redes sociais,
plataformas virtuais que se tornaram um importante espaço de propaganda,
recrutamento e organização, dados publicados por diversos órgãos preocupados
com essa questão, como fez o Observatório do Terceiro Setor. A antropóloga Adriana Abreu Magalhães Dias, pesquisadora da UNICAMP e
que se debruça a pesquisar a atuação de grupos de extrema-direita por meio da
internet, afirmou, em 2019, que 334 grupos estavam em plena atividade através
de sítios eletrônicos, blogues e plataformas de compartilhamento de vídeos.
Essa rede formada por todos esses espaços constitui um poderoso veículo de
disseminação das teorias nazifascistas e não se encerram no meio virtual:
articulam-se com a vida nas ruas, por meio de grupos que agem como gangues que
ocupam bairros inteiros em constante disputa territorial.
Entre o ex presidente
Bolsonaro e tais grupos há uma identificação antiga. O veículo de notícias do
portal UOL veicula, ainda em 06 de abril de 2011 – portanto, sete anos antes de
sua eleição, em outubro de 2018 – a seguinte matéria: Neonazistas ajudam a convocar “ato
cívico” pró-Bolsonaro em São Paulo. Tratou-se de um ato em apoio ao
então deputado Jair Bolsonaro, então envolvido em polêmica provocada por
declarações de cunho racista feitas em um programa de televisão. Se o ato de
2011 pode parecer algo eventual, a matéria do jornal eletrônico El País de, 09
de junho de 2020, traz o título: Sites neonazistas crescem no Brasil
espelhados no discurso de Bolsonaro, aponta ONG, no qual os
jornalistas Gil Alessi e Naira Hofmeister apontam as atrações mútuas entre tais
agrupamentos e o ex presidente da república.
O fato é que tais
organizações e militantes nazifascistas têm um longo histórico no Brasil e
tiveram um importante papel na ascensão do conservadorismo no país e que veio culminar
na eleição de Jair Bolsonaro para presidente da república.
Contextos
geopolíticos
Outro elemento a se
destacar nesse complexo que acreditamos formar o ninho em que o ovo da serpente
bolsonarista eclodiu é o contexto econômico e geopolítico que compreende, pelo
menos, desde meados dos anos de 1990 até o ano de 2014. O início daquele
período foi marcado pela alta dos preços das commodities provocados por
uma série de fatos combinando desde problemas climáticos em determinadas
regiões do mundo, passando pela queda do valor do dólar, até o excepcional
crescimento econômico chinês, que se tornou um dos maiores consumidores de commodities
no mercado internacional, dentre outros. O fato é que o Brasil foi um dos principais
beneficiários dessa situação, sobretudo no final do primeiro mandato do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que em quase todo o seu primeiro mandato
executou políticas econômicas de austeridade. Quando o governo petista passou a
se aproveitar do contexto favorável, o Brasil passou a inspirar otimismo e
expirar crescimento, surgindo no horizonte global como uma das mais importantes
nações do início do século XXI. Combina-se a isso a eleição de Barack
Obama para a presidência dos Estados Unidos da América, que instituiu o smart
power como orientação de
sua política externa, que, segundo sua secretária de Estado, Hillary Clinton,
poderia ser definida como: a “gama
completa de ferramentas à nossa disposição – tanto diplomáticas, econômicas,
militares, quanto políticas e culturais – escolhendo a ferramenta certa, ou a
combinação delas, para cada situação. Com o smart power, a
diplomacia será a vanguarda da política externa”. Isso significa desde
os elogios rasgados que Obama fez a Lula, ou as fotos em que aparece comendo
hambúrgueres com o então presidente russo Dimitri Medvedev, ou o abraço que
tentou dar em Raul Castro (dignamente frustrado pelo então chefe de Estado
cubano), até o brutal assassinato de Muamar Kadafi. E para compreendermos os
aspectos mais sombrios do smart power em solo pátrio citamos as ações de
espionagem e sedição contra a presidente Dilma Rousseff. O sítio eletrônico
WikiLeaks vazou informações denunciando o aparato de espionagem implantado pelo
governo Obama sobre ela e uma série de seus assessores e outros funcionários de
altos cargos estatais, demonstrando o interesse do Estado estadunidense sobre
os rumos políticos e econômicos do governo brasileiro. Não podemos esquecer
também a participação brasileira na organização transnacional que reúne a
Rússia, a Índia, a África do Sul e a China, e que foi batizada de BRICS. A
relevância geopolítica dessa organização cresceu rapidamente e se tornou mais
aguda quando iniciaram as tratativas para a formação de um banco transnacional
de investimentos, o New Development Bank (NDB), o que representou, naquela
ocasião, uma imensa afronta ao controle econômico da geopolítica mantido pelos
EUA. Em matéria veiculada pelo El País, o presidente chinês Xi Jinping falou a
respeito do papel dos BRICS: “[...] aperfeiçoar
o sistema de governo mundial e ampliar a representação e o direito de falar
sobre assuntos internacionais de todos os países emergentes”, e a
matéria segue apresentando o que pensava a presidente Dilma Rousseff: “Sobre isto, Rousseff lembrou que o banco não
se faz contra o FMI, ‘mas se faz a favor de nós mesmos’, afirmou. ‘O mundo se
transformou num espaço bilateral e as instituições que o representam devem ser
assim’, disse”. Mais ainda, os BRICS se movimentavam no sentido de
impor um novo sentido às relações internacionais, buscando maior estabilidade
para o desenvolvimento global e o fazendo por fora da esfera de influência dos
EUA e da Europa ocidental. Não se tratando de uma proposta de ruptura com o
capitalismo, ainda assim se coloca em oposição à lógica desregulamentada do
neoliberalismo. Isso posto, não fica difícil entender que a espionagem
promovida pelos EUA sobre o governo brasileiro foi motivada por interesses
econômicos e geopolíticos claros de atentar contra o desenvolvimento de uma força
política contra-hegemônica e, ainda, assentar o país em sua posição subordinada
ao bloco imperialista sob controle estadunidense, o que se efetivou com a
deposição da presidenta Dilma Rousseff.
O paroquialismo da
política nacional e a nacionalização do “baixo-clero”
O filósofo político
Marcos Nobre, professor da Universidade de Campinas, UNICAMP, em seu livro O
imobilismo em movimento apresenta o pemedebismo, nome com que
trata uma certa cultura política brasileira que se forma no processo de redemocratização
do país, ao final da ditadura empresarial-militar. Segundo ele, o
restabelecimento do regime democrático permitiu a emergência de um grande
partido, o PMDB, que ocupa o centro político e que passa a formar uma “super
maioria”, que em tempos recentemente tentou se autodenominar “centro
democrático”, mas que continua a ser chamada popularmente de “baixo clero” ou
“centrão”. Tivemos a oportunidade de definir o “baixo-clero” da seguinte forma
em publicação no Le Monde Diplomatique Brasil, já citada acima: “[...] grupo de parlamentares que integram partidos
sem um verdadeiro programa para o país e que se aproveitam de sua presença no
parlamento para garantir que o Estado mantenha a manutenção de seus interesses
e privilégios. São políticos sem expressividade nacional, verdadeiros coronéis
que ainda mantém currais eleitorais em suas regiões, são como os Magalhães na
Bahia, Sarneys no Maranhão, ou Calheiros em Alagoas”. Apesar de seu
histórico caráter fragmentário, essa “super maioria” mantém tamanho poder
parlamentar que força todos os governos a abrir negociações para que consigam
aprovar seus projetos e garantir condições para governar.
Enquanto os
presidentes eleitos após a redemocratização eram oriundos do mesmo campo
político que o “baixo-clero” a negociação que se estabelecia entre ambos tinha
uma determinada magnitude cujo atendimento das demandas tinha por consequência
manter a “super maioria” em seu caráter fragmentário. Todavia, quando o Partido
dos Trabalhadores assumiu o governo pela primeira vez optou pelo que o filósofo
político André Singer denominou pacto conservador. Assim, passaram a
fazer parte da “base aliada” do PT toda sorte de chefes políticos, lideranças
neopentecostais, lideranças comunitárias conservadoras, dirigentes de
sindicatos e outros mais. No entanto, no grau em que ocorreu, a associação
entre os governos petistas e o "baixo-clero'' levou ao fortalecimento deste
agrupamento, não apenas em nível federal, mas em conexões que se estenderam por
estados e cidades em que o pacto conservador foi reproduzido. O
"baixo-clero'' assim reforçado passou a constituir uma força política
poderosa, nacionalizada e com uma base popular própria. Ao mesmo tempo, a
renovação conservadora do Parlamento aumentou seu ímpeto disruptivo, que se
materializou na formação de um campo político reacionário. Esse campo foi forte
o bastante para hegemonizar o Congresso, desde então.
Mas ainda faltava a
esse movimento uma liderança que pudesse submeter e unificar suas lideranças,
aglutinar esse campo em torno de um programa político unificado; três
“candidatos” à assumir essa liderança se apresentaram, todos do MBD, eram eles
o presidente do senado, Renan Calheiros, o presidente da câmara, Eduardo Cunha
e o vice-presidente da República, Michel temer. Na contenda entre os três, saiu
vitorioso o vice-presidente, sendo inevitável imaginar que a sua saída das
sombras para a luz do protagonismo político seja o seu desfile vitorioso por
sobre os inimigos abatidos. Mas sua vitória não durou tanto quanto
desejava, pois, por um lado, sua falta de base popular o impedia de tornar-se
um líder político de fato, e, por outro, o campo reacionário mostrava-se refratário
aos políticos tradicionais, mesmo os de direita.
Jair Messias
Bolsonaro não teve nenhuma participação na criação de todo esse ambiente, mas
foi hábil em aproveitar-se dele, despontando das mais obscuras camadas do
“baixo-clero”, até tornar-se a representação política desse campo. Até então,
ele não passava de um caricato deputado federal pelo Estado do Rio de Janeiro
por quase três décadas, chefe político carioca e capitão do exército reformado
por má conduta. Bolsonaro já tinha alguma notoriedade por proferir discursos
agressivos contra negros, mulheres, comunidade LGBTQIA+ e militantes de
esquerda, além de saudar a ditadura empresarial-militar (1964-1985) e outros
ainda com o mesmo teor. Sua verve excêntrica, fez dele uma figura presente em
programas humorísticos como Casseta e Planeta, Urgente!,
veiculados pela Rede Globo, entre 1992 e 2010, e Custe O Que Custar
(CQC), veiculado pela Rede
Bandeirantes, entre 2008 e 2015.
Olhando em
retrospecto, percebe-se que sua ascensão é muito mais um efeito colateral
daquele processo político do que parte dos planos da burguesia, que certamente
tinha no PSDB um legítimo representante. De qualquer forma, aproveitando-se da
conjuntura, Bolsonaro soube navegar naquela situação crítica, tornando-se o
líder de um movimento reacionário.
A disputa campal por
territórios e significados nos atos de 2013
2013 transcorreu como
um daqueles anos em que uma única centelha pode incendiar toda a pradaria. No
caso, a centelha potencialmente incendiária foram os vinte centavos
acrescentados ao valor das passagens de ônibus na capital paulista. O reajuste
provocou protestos mobilizados pelo Movimento Passe Livre, iniciados no dia 06
de junho daquele ano, e foram, logo no seu início, duramente reprimidos pela
Polícia Militar. Protestos também ocorreram em outras cidades e capitais
brasileiras, como Porto Alegre, Salvador, Goiânia e Rio de Janeiro. A matéria
intitulada Saiba mais sobre os protestos em SP contra aumentos de ônibus e metrô,
publicada pelo veículo de imprensa
eletrônica G1, em 11 de junho de 2013, apresentou um ligeiro histórico do MPL.
A matéria destaca que, desde o ano de 2004, os integrantes do coletivo
ministravam formações políticas para o alunado de escolas públicas em áreas
específicas da cidade de São Paulo, debatendo, a princípio, a gratuidade de
passagens para a comunidade escolar e, com a ampliação do seu círculo de apoio
e debates, passaram a pautar a sua gratuidade universal. Ou seja, ampliaram a
pauta e passaram a promover a crítica do transporte “mercadoria” e
reivindicá-lo como direito social, arrastando para a luz o que as empresas
privadas de transporte gastam fortunas para manter à sombra: a privatização do
direito ao transporte. E no bojo dessa crítica, provocaram o transbordamento do
debate sobre todos os direitos sociais que são submetidos à lógica dos
interesses privados, situação que Silvio Caccia Brava, explicou nos seguintes
termos: “Essa equação de ‘quem usa é
só quem paga’ é perversa porque exclui um terço dos cidadãos das regiões
metropolitanas, que não têm recursos para arcar com o preço da tarifa. Estes
andam a pé, alguns poucos de bicicleta. Esse modelo consagra a ideia de que o
transporte público é uma mercadoria, não um direito. Só tem acesso a ele quem
paga. E as empresas que o operam têm de ser lucrativas”.
Conquanto o MPL tenha
mobilizado milhares de pessoas pelo país, formando uma multidão de milhões de
brasileiros inconformados e em protestos contínuos e seguidamente desafiando as
autoridades políticas e policiais, o Movimento passou a sofrer com a dura
disputa pelos significados dos atos. Em pouco tempo os cartazes levantados
pelas pessoas passaram a expor reivindicações cada vez mais difusas e
moralistas, muitas de cunho chauvinista. Talvez o marco expressivo dessa
disputa seja a abrupta mudança de "opinião" do comentarista político
do Jornal da Globo, Arnaldo Jabor. Uma semana após o primeiro ato na cidade de
São Paulo, em 13 de junho, o comentarista afirmou que os jovens na rua não
passavam de “filhos da classe média” movidos tão somente por “burrice
misturada a rancor e sem rumo”. Todavia, passados apenas poucos dias depois
daquela intervenção, em 17 de junho, retratou-se afirmando: “uma juventude
que estava calada desde 92, uma juventude que nascia quando Collor caia,
acordou”. A disputa não se deu apenas pela mudança das narrativas das
grandes emissoras e seus formadores de opinião: tomados por uma militância de
extrema-direita que já estava em formação há muitos anos, em pouco tempo os
protestos passaram a hostilizar os militantes de esquerda presentes, sendo o
ápice dessa hostilização o ato do dia 20 de junho, na Avenida Paulista. Na
ocasião, os militantes de extrema-direita vestidos com camisetas de cores verde
e amarela insuflavam a população com organizados gritos como “abaixa a
bandeira”, “sem partido” e “puta que o pariu, abaixa essa
bandeira e levanta a do Brasil”. A massa mobilizada por aquela militância
formou um imenso bloco que acuou e empurrou os militantes das organizações
partidárias PT, PSOL, PCB, Esquerda Marxista, PSTU e outros rumo à Rua da
Consolação, onde se dispersaram sob severas ameaças de agressão física. A
respeito dessa virada, tive a oportunidade de escrever para o periódico Le Monde
Diplomatique, em sua edição de 20 de maio de 2020: “A atuação das polícias também mudou: pararam de reprimir os
manifestantes para defendê-los em suas longas caminhadas. De gritos de
palavras-de-ordem passou-se a cantar o Hino Nacional, e o branco tornou-se a
cor predominante em diversos atos substituindo o vermelho e negro das
vestimentas dos black-blocs”.
O ocorrido na Avenida
Paulista, naquele 20 de junho de 2013, tratou-se praticamente de uma disputa
campal, uma guerra por territórios. Tipo de disputa que não é nova no país:
conhece-se muito a já citada Revoada dos Galinhas Verdes, na praça da Sé, mas
as disputas territoriais entre fascistas e antifascistas são mais constantes do
que divulgadas.
A deposição de Dilma
Rousseff
O mundo sofreu um
gigantesco abalo a partir de 2008, quando se iniciou nos EUA a crise que
desarranjou o capitalismo. Na ocasião, o então presidente Lula acreditava que o
mercado internacional de commodities continuaria favorável e, portanto,
se a crise econômica chegasse ao país, não passaria de uma “marolinha”. Sua
crença era de que seria possível superar a crise que se avolumava mantendo a
contraditória combinação entre as políticas desenvolvimentistas e o atendimento
dos interesses do rentismo. Como o desdobrar dos fatos mostraram, as previsões
do presidente eram equivocadas, e a nossa economia estava muito mais
subordinadas ao cenário global do que ele supunha, e, portanto, as políticas
internas sem rompimento com aquele cenário não foram suficientes para conter a
“marolinha” que era, na verdade, um vagalhão. Por isso, ao passar a faixa
presidencial para sua sucessora, Dilma Rousseff, em 2010, ele também lhe
passava uma bomba-relógio que logo explodiria.
O primeiro mandato de
Dilma se iniciou já sob as dificuldades provocadas por um mercado internacional
instável ao mesmo tempo em que se formava um desconfortável contexto doméstico:
o quadro econômico nacional se degradava rapidamente; o sistema financeiro
passa a acossar o governo e o arranjo entre políticas desenvolvimentistas e
liberais começava a se esfacelar. Aproveitando-se do momento conturbado do
governo de Dilma, o PSDB buscou escapar do isolamento político tentando liderar
a oposição ao Partido dos Trabalhadores, ao passo em que os meios de
comunicação iniciaram um constantemente suas políticas econômicas. Se tudo isso
já não fosse o suficiente, recrudesceram os ataques imperialistas capitaneados
pelos EUA. Esse é o cenário em que irromperam as manifestações de julho de
2013.
Naquele ano, milhares
de jovens ocuparam as ruas para protestar contra o aumento das passagens de
ônibus e questionando a relação entre o direito ao transporte e o transporte
enquanto mercadoria. Em pouco tempo, o movimento foi capturado por novas
palavras de ordens, associando o governo petista a toda sorte de esquemas de
corrupção e acusando os partidos de esquerda de oportunismo e parasitismo. Tais
palavras de ordem passaram a ser repercutidas insistentemente pela grande
imprensa, por formadores de opinião e por grupos que começavam a despontar, como
Vem Prá Rua e Movimento Brasil Livre. Esses grupos eram capitaneados por jovens
lideranças carismáticas, propagandistas bem treinados e capacitados como Kim
Kataguiri, Fernando Holiday e Rogério Chequer. Também havia diversos
oportunistas que passaram a associar-se a esse amplo movimento como os músicos
Roger Moreira e Lobão, o ex-ator Alexandre Frota e atores e atrizes como
Marcelo Serrado, Alexandre Garcia, Susana Vieira e Luiza Tomé. Além deles,
muitos outros formadores de opinião embarcaram numa verdadeira caravana
antipetista e ampliaram ainda mais a repercussão anti-comunista e por uma
renovação política sem participação de partidos ou agentes de esquerda,
recuperando as mais confusas expressões do chamado perigo vermelho, tão
propalado durante a Guerra Fria.
Apesar de todos os
ataques sofridos, Dilma conseguiu reeleger-se em 2014, vencendo por uma pequena
margem de votos seu adversário no segundo turno, o candidato Aécio Neves, do
PSDB. No entanto, ainda que o PT tenha vencido as eleições presidenciais, foi a
direita e a extrema-direita quem venceu as eleições para a composição do
Congresso Nacional. Todas as manifestações, campanhas negativas e ataques de
diversas naturezas, inclusive as mais bárbaras ofensas machistas contra Dilma e
toda a esquerda, desencadeadas a partir de 2013, criaram um “caldo de cultura”
de forte cunho reacionário, levando à eleição do mais conservador congresso
desde o golpe de 1964, sobre o qual escreveu o Departamento Intersindical de
Assessoria Parlamentar (2014): “O
Congresso eleito em 2014, renovado em 46,59% na Câmara e em 81,48% em relação
às vagas em disputa no Senado, é pulverizado partidariamente, liberal
economicamente, conservador socialmente, atrasado do ponto de vista dos
direitos humanos e temerário em questões ambientais”. Dito em outras
palavras, o que antes só foi possível à força de um golpe, agora obteve-se pelo
voto popular. Aproveitando-se desse clima, pouco após as eleições, Aécio Neves
levantou nova palavra de ordem: não aceitando o resultado das eleições, passou
a exigir a deposição da presidenta pela vaga acusação de “estelionato
eleitoral”. Enquanto o PSDB se esforçava para voltar ao protagonismo da
política nacional, o “baixo-clero”, com a faca entre dentes, percebia a
formação do clima propício para virar a mesa da conciliação de classes contra
quem bancava o seu almoço: os governos petistas. A maioria do Congresso começa
a pressionar o governo de Dilma, utilizando para isso das chamadas
“pautas-bombas”, que travavam as suas discussões e impediam o andamento de
iniciativas do governo federal. Todas essas forças conservadoras, oportunistas
e reacionárias passaram a concorrer no mesmo sentido: a interrupção do segundo
mandato da presidenta. Sabemos suficientemente bem como se desenvolveu o processo
que levou até a sua deposição, em 31 de agosto de 2016, quando se encerrou o
primeiro ato do golpe que mudou o país. Michel Temer eleva-se à presidência da
república e inicia as profundas reformas liberais exigidas pela burguesia, no
entanto, enfrenta muita resistência e, ao fim e ao cabo, não contava com o
apoio popular necessário para efetivar toda a agenda liberal esperada. E
contava menos ainda com a legitimação das urnas para ocupar a cadeira em que
passou a despachar. Pouco tempo após a efetivação de Michel Temer como o novo
presidente da república, inicia-se a corrida eleitoral para 2018.
A Lava Jato e as
eleições de 2018
Na manhã da
segunda-feira, 17 de março de 2014, uma série de investigações da Polícia
Federal foram unificadas em uma única operação, cuja alcunha era Lava Jato. Em
campo, 400 agentes federais cumprindo 81 mandados de busca e apreensão
descobriram a ponta de um novelo que envolvia uma ampla rede de corrupção
envolvendo doleiros, empresários e dirigentes de empresas estatais. As
investigações passaram a se desdobrar em diversas frentes pelo país, o que
exigiu, por parte do Ministério Público Federal, a organização de
forças-tarefas e outras iniciativas investigativas que acabaram sendo
conhecidas genericamente como “força-tarefa da Lava Jato”. Esse empreendimento
se desdobrou em mais de 80 fases de operações e mais de mil mandados de prisão,
sua sede principal era o Ministério Público Federal de Curitiba, no Paraná, e
graças aos seus desdobramentos o procurador da república Deltan Dallagnol e o
juiz federal Sérgio Moro foram alçados à condição de verdadeiros heróis
nacionais.
O que surgiu como um
significativo esforço contra a corrupção sistêmica no Estado brasileiro logo se
converteu em perseguição política contra a então presidenta Dilma Rousseff e o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o principal candidato à presidência em
2018, e conferiu ares de legalidade a uma das principais etapas do golpe
desferido contra o povo brasileiro em 2016. Utilizando-se de vazamentos
seletivos de informações para os grandes veículos de informação, Moro e parte
dos procuradores que integravam a Lava Jato garantiram a contínua construção de
uma campanha de convencimento que praticamente sentenciou os governos petistas
ante a opinião pública, e que o Estado brasileiro, mergulhado em “esquemas de
corrupção” precisaria passar por profundas transformações estruturais. Em
pesquisa realizada em 2017, constatou-se que “Para 78% dos brasileiros, o nível de corrupção aumentou no país”.
Graças a essa campanha as ruas passaram a ser tomadas por manifestações cada
vez mais hostis que pediam a interrupção do governo Dilma enquanto ovacionavam
Moro como um herói nacional. É preciso destacar que Dilma nunca se tornou alvo
de investigação da Lava Jato, ainda assim, a maneira como a Força-Tarefa
centrou fogo em altos cargos de seu governo e em quadros de direção do Partido
dos Trabalhadores fez com que a presidente fosse tragada pelas narrativas
criadas.
Enquanto ainda se
organizava o golpe palaciano que depôs a presidenta Dilma Rousseff, a Lava Jato
também manteve sua carga voltada contra o PT e Lula, já então com as eleições
de 2018 em seu horizonte. Lula foi condenado por Sérgio Moro, em primeira
instância, a nove anos e seis meses de prisão, no dia 12 de julho de 2017, por
“crimes de corrupção passiva e lavagem
de dinheiro no caso do tríplex no Guarujá”. Em 28 de janeiro do ano
seguinte, a oitava turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4),
confirmou a condenação do ex-presidente, aumentando a pena para doze anos e um
mês. Um pouco mais de três meses depois, no dia 18 de abril, aquela mesma turma
rejeitou o último recurso apresentado pela defesa do ex-presidente Lula,
encerrando a tramitação em segunda instância do processo e tirando, em
definitivo, as suas chances de concorrer às eleições daquele ano. As forças
políticas do Brasil deram livre curso às investidas da Lava Jato contra
diversos políticos, garantindo que muitos fossem preservados de acordo com a
conveniência, como ocorreu com Geraldo Alckmin.
Lula é impedido de
concorrer às eleições, todavia, os candidatos mais afeitos aos interesses da
burguesia, como Geraldo Alckmin e Henrique Meirelles, por sua vez, não decolam
nas pesquisas. Sob risco de ver o cavalo da oportunidade passar à sua frente sem
conseguir montá-lo, a burguesia abandona seus candidatos e passa a apoiar Jair
Messias Bolsonaro. O ex capitão se elegeu vencendo Fernando Haddad, com um
pouco mais de 55% dos votos, encerrando assim o terceiro ato do golpe.
3. UMA CONCLUSÃO POSSÍVEL
O estudo da
experiência recente da política brasileira à luz de tais formulações sobre o
fascismo nos permite compreender como a ascensão da forma-fascismo bolsonarista
não é um “ponto fora da curva”, uma excepcionalidade ou algo assim. A despeito
de todo o regressismo de seu discurso, o bolsonarismo surgiu como uma
contradição e uma alternativa ao lulismo e inaugurou um novo momento histórico.
Essa contradição tem, como cerne, o grau profundo e promíscuo com o qual o
Partido dos Trabalhadores associou-se com o “baixo-clero”, tão bem explicado no
já citado livro de André Singer, Os sentidos do lulismo:
reforma gradual e pacto conservador. Não podemos esquecer que quase
todos os sujeitos políticos que estiveram na proa do golpe contra o governo do
PT foram, anteriormente, seus associados. Mesmo Bolsonaro estava filiado ao
Partido Progressista de Maluf, então na “base aliada” dos governos petistas.
Evidentemente que não estamos defendendo que a ascensão do fascismo
bolsonarista tenha sido parte dos planos petistas, como já dissemos. Mas as
escolhas políticas feitas pelo Partido dos Trabalhadores em busca da eleição de
Luiz Inácio Lula da Silva levaram ao fortalecimento do “baixo-clero” enquanto
enfraquecia os setores à esquerda do espectro político nacional.
Por isso, mesmo uma
eventual derrota eleitoral do bolsonarismo não o eliminará das dinâmicas da
luta de classes no Brasil. Pode ser que se altere, que ganhe novos contornos e
referências, mas não deixará de existir. Em seu bojo, o “baixo-clero” tornou-se
uma força nacional que representa os anseios de boa parte da pequena-burguesia;
o senso comum foi militarizado; o pensamento individualista avançou; o Estado
profundo brasileiro ampliou-se e aprofundou-se com os militares ocuparam e hoje
influenciam espectros da burocracia estatal em tal proporção nunca visto antes
etc.
Na trilha aberta pela
ascensão do Bolsonarismo muita coisa mudou no Brasil e isso convoca-nos a
atualizar as reflexões e os debates acerca do fascismo e sua atualidade. Este
artigo é um esforço neste sentido.
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