A questão central é descobrir se você
quer uma cidade para as pessoas ou
para o lucro. Para construir uma cidade
diferente, é preciso ser anticapitalista.
Não há outra forma.
David Harvey
A Rede
Brasileira de Teatro de Rua (RBTR), formada em 2007, realizará em março, na
cidade de Salvador (BA), mais um Encontro. O evento vem se desenhando para ser
um dos maiores e mais importantes, voltando a se reunir justamente na mesma cidade onde surgiu o coletivo. A recepção e organização é do Movimento de Teatro de Rua
da Bahia (MTR/BA), que realizará também uma Mostra Nordestina de Teatro de Rua.
A RBTR
é o único movimento organizado nacionalmente em seu seguimento e que continua a
crescer. O atual momento político faz com que o coletivo tenha muitos desafios
pela frente. Por outro lado, justamente por não ter nada a perder pode
radicalizar sua luta. Por ser um movimento classista, deve disputar a cidade
por meio de sua arte, papel que já realizam, mas que precisa ser intensificado
na medida em que as cidades, médias e grandes, tornaram–se produtos, sendo
fontes inesgotáveis para o lucro capitalista e, devido ao momento político,
deve ser exacerbado. Mas a questão atual não é só um problema de lucros, há outras frentes que precisamos atuar.
Material gráfico do Encontro do MTR/BA e da RBTR. |
Os
objetivos estão interconectados, mas não fáceis de serem realizados, até porque
não é de hoje que artistas populares são perseguidos, ameaçados e sofrem
violências de todo tipo. O momento é de alerta, embora mais que nunca necessário
que ocupemos as ruas. Claro que ao longo da história da humanidade os artistas
populares sempre foram perseguidos e quem escolhe a rua como palco, sabe que ao
fazê-lo trata-se de uma escolha política. Se não sabe, descobre rapidamente. Trata-se
de disputa, não só de realizar uma arte diferente e que chega a todos sem
distinção, mas que também intervém em como se deve pensar a cidade e nosso país.
Logo, ao se colocar no espaço aberto, todo artista deveria disputar o
imaginário das pessoas, disputar uma concepção de cidade e de mundo.
Para
avançar na luta se faz necessário políticas públicas, na medida em que seus
fazedores não veem sua arte como mercadoria, mas como possibilidade do
desenvolvimento humano e como construção de conhecimento. Requer, portanto,
investimento material, recursos que só poderão advir do Estado. Mas, mesmo aí
há limites, na medida em que o próprio Estado, burguês que é, serve ao capital
e não aos interesses sociais, ainda mais agora, completamente tomado pela
burguesia financeira, pelo agronegócio e outras forças reacionárias. Mas o Estado também pode e deve ser disputado.
Por realizarmos uma luta anticapitalista, devemos construir alianças com outros seguimentos organizados da classe trabalhadora, agora mais que nunca, juntarmo-nos a movimentos sociais, sindicatos e outras organizações institucionais, para realizarmos a luta. Importante também fazer com que esses organismos compreendam a importância da arte e da cultura na disputa por outra hegemonia cultural, algo que, em nosso entender, a esquerda sempre negligenciou. Afinal, não é possível mudar o mundo se não pensarmos em mudar os valores culturais que o norteiam. Logo, há uma dupla tarefa juntos aos movimentos: aliarmo-nos e, ao mesmo tempo, convencê-los da força da arte na criação de um novo imaginário. Como o velho está grávido do novo, há esperança! Claro que não basta esperar, é preciso parir o novo. E se os artistas populares nunca saíram de perto da população, dos trabalhadores, cabe apenas um maior e melhor direcionamento político nas ações e em suas criações.
Por realizarmos uma luta anticapitalista, devemos construir alianças com outros seguimentos organizados da classe trabalhadora, agora mais que nunca, juntarmo-nos a movimentos sociais, sindicatos e outras organizações institucionais, para realizarmos a luta. Importante também fazer com que esses organismos compreendam a importância da arte e da cultura na disputa por outra hegemonia cultural, algo que, em nosso entender, a esquerda sempre negligenciou. Afinal, não é possível mudar o mundo se não pensarmos em mudar os valores culturais que o norteiam. Logo, há uma dupla tarefa juntos aos movimentos: aliarmo-nos e, ao mesmo tempo, convencê-los da força da arte na criação de um novo imaginário. Como o velho está grávido do novo, há esperança! Claro que não basta esperar, é preciso parir o novo. E se os artistas populares nunca saíram de perto da população, dos trabalhadores, cabe apenas um maior e melhor direcionamento político nas ações e em suas criações.
O
teatro de rua tem a possibilidade de ir a qualquer lugar sem perder seus pressupostos
estéticos, acampamentos, comunidades ribeirinhas, vilas, centro e periferia das
cidades. Mas, no caso do teatro de rua brasileiro, tem se apresentado principalmente
nas cidades, onde vive a maior parte da população. Para Henri Lefebvre, as
cidades são mediação de mediações, sendo que cada época histórica carregam os
símbolos e a organização de seu tempo. Dessa forma, suas mudanças ocorrem quando
muda a sociedade em seu conjunto. Assim, para além de suas transformações
físicas, as cidades nem sempre foram as mesmas, mas modificam suas funções de
acordo com o período histórico. Logo, espaços que não eram restritos podem vir
a ser. O exemplo mais recente vem de Curitiba, em que um Decreto Municipal tenta restringir certa área central utilizada a bastante tempo por artistas de rua. Fiquemos atentos!
Em
sendo criada como o espaço em que ocorrem as mediações, a cidade deveria ser
associada a uma espécie de obra de arte. Ao assumirmos esse ponto de vista, deveria
prevalecer na cidade o seu valor de uso, invés de um valor de troca. No
entanto, em um capitalismo cada vez mais desenvolvido, a própria cidade
torna-se mercadoria e deve ser vendida para auferir grandes lucros aos
capitalistas, que utilizam as esferas do Estado para realizam essas tarefas. Já se sabe que a
forma não está separada do conteúdo, logo, a cidade, em uma economia de mercado,
deve servir de mediação ao lucro. Essa lógica cria guetos, bolsões de misérias,
entre outros.
Encontro da RBTR na Aldeia de Arcozelo - Paty do Alferes/RJ, abril de 2009. |
Nesse
momento, o Brasil passa por uma disputa desigual. A pressão econômica fará com
que as cidades sejam sitiadas e prevaleçam o mercadológico e não o direito à cidade,
a ralé será expurgada. E nós somos a ralé. Nossa tarefa – claro que não sozinhos – será fazer
frente a esse futuro nada promissor. A nossa favor, cabe lembrar que todo artista
de rua é dono de seus meios de produção e de suas obras, logo, foge da lógica
instituída, o que nos dá certa liberdade de criação, assim como temos certa liberdade para quem queremos apresentar
nossa arte.
Os
artistas de rua resistiram por milênios e continuarão a existir e resistir. Esperamos
que o Encontro a ser realizado em Salvador/BA, doze anos após a criação da
RBTR, possa discutir, criar e inventar táticas e estratégias para sobrevivermos
a esse momento difícil e que também possamos continuar sendo uma ponte não só
para a fruição, mas para criar possibilidades de imaginarmos um outro mundo
onde a igualdade e justiça prevaleçam.
[1]
Professor do Curso Licenciatura em Teatro da Universidade Federal de Rondônia; Mestre
em Artes pela Universidade Estadual Paulista-UNESP; articulador da RBTR;
integrante do Teatro Ruante.
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