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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Fotos e informe da montagem de Mutirão em Novo Sol no Encontro Unitário

Companheiras e companheiros,

No dia 21 de agosto, terça passada, ocorreu um momento marcante, o encontro de dois tempos históricos da produção do Teatro Político brasileiro. No Encontro Unitário Trabalhadores e Trabalhadoras dos Povos do Campo, das Águas e das Florestas, após 52 anos do primeiro encontro nacional de camponeses do Brasil, foi reapresentada uma versão adaptada da peça Mutirão em Novo Sol, escrita por Nelson Xavier, Augusto Boal, Modesto Carone, Hamilton Trevisan e Benedito Araújo.

O elenco foi composto pelo núcleo da Brigada Semeadores, de agitprop do MST/DFE, com participação de atrizes do elenco do Coletivo TerraemCena, do campus de Planaltina da UnB, de estudantes do curso de Agroecologia do Instituto Federal de Brasília e de militantes do MST/MS e do MST/SE.

A peça até hoje não foi publicada, mas desde 2008 ela é trabalhada nos cursos da Educação do Campo, nos cursos de Artes do Pronera, e nos cursos internos de formação do MST e da Via Campesina. Nelson Xavier tinha a peça guardada em sua biblioteca pessoal, uma versão datilografada, de 1962, data da montagem da peça pelo MCP, dirigida por ele. Procuramos a peça por conta da pesquisa de doutorado sobre a relação entre Teatro Político e Questão agrária no Brasil, de 1955 e 1965.

Nosso interesse era devido ao fato de Boal em vários textos e conversas com a Brigada Nacional de Teatro do MST ter se referido à peça como um momento emblemático do encontro da produção do teatro político com a luta camponesa da década de 1960.

A peça teve uma versão gravada para rádio pela turma de Comunicação e Cultura de ensino médio do Iterra, a Semeadores fez algumas montagens da versão adaptada, no assentamento Gabriela Monteiro, no Instituto Federal de Brasília e no campus de Planaltina da UnB. E, na terça, fizemos o que pretendíamos desde que começamos a trabalhar com a peça,
mostrá-la em cena, para a militância dos movimentos sociais do campo, quilombolas, indígenas, pescadores, que hoje dá continuidade à luta.

Por cerca de meia hora os 5 mil militantes participantes do encontro assistiram em silêncio a montagem, concentrados no desdobramento do julgamento dos camponeses pelo conluio entre o Juiz e o Coronel Porfírio. Ao final, a plenária acolheu o grupo com uma bonita salva de palmas, vejam a foto. E, em seguida, Nelson Xavier deu belo depoimento sobre o engajamento dele e de seus companheiros, Boal, Vianinha, Guarnieri, Milton Gonçalves, Flávio MIgliacio, na década de 1960.
Emocionado, em fala que comoveu a todas e todos que lhe escutavam, ele disse que sentiu que a sua vida foi útil, pelo significado que a peça tem até hoje, para tanta gente.

Depois, militantes da Cultura e Comunicação dos movimentos ali presentes, os estudantes da turma do curso de Artes que o MST tem com a UFPI, e o elenco da peça, tiveram conversa de mais de duas horas com Nelson, momento em que ele explicou com riqueza de detalhes como funcionava o Movimento de Cultura Popular (MCP) e o Centro Popular de
Cultura (CPC), além da forma organizativa e dos embates internos no Teatro de Arena. Ele enfatizou que o golpe foi o marco de virada regressiva para boa parte daquela militância engajada, que depois teve que procurar um meio de sobreviver.

Enfim, há muito o que contar dessa conversa, e do que aprendemos com a montagem dessa peça, sobre a relação entre qualidade estética e tendência política que Walter Benjamin tanto falava, sobre a função do teatro de agitação e propaganda, tão injustamente renegado por décadas, e desde o trabalho de Iná Camargo Costa (A hora do teatro épico no Brasil/1996) devidamente recuperado para o debate sobre cultura e política de interesse da classe trabalhadora.

Por ser um trabalho coletivo, de longa data, naquele momento sentimos conosco a força de todas as pessoas que com ele se envolveram, desde a luta que deu origem a peça, em Jales, em 1959, passando pelos dramaturgos que escreveram o texto, pelos atores que o montaram, pelos camponeses que o demandaram em função da luta que faziam, pelos
companheiros e companheiras da Brigada Nacional de Teatro do MST Patativa do Assaré e do Coletivo de Cultura, pela militância que trabalhou com a peça nos cursos, pelo apoio intelectual e agitador da companheira Iná Camargo Costa.

A peça foi apresentada de tarde, fato notado com surpresa pelo próprio Nelson Xavier. Não foi o momento supostamente reservado para o entretenimento, foi o momento do debate político, o momento da formação, sinal da maturidade com que as organizações têem encarado a dimensão formativa da produção cultural. Pela primeira vez contamos com todo o apoio político e financeiro da coordenação do evento, tivemos um aparato de microfonagem inédito, fundamental para a
garantia da escuta de uma plenária de 5 mil pessoas. Nossos agradecimentos.

Por fim, saímos todos desse momento com a certeza de que temos muito a aprender com o espírito combativo e solidário da geração que empenhou suas vidas na década de 1960 para lutar pela Revolução Brasileira. A disciplina teórica daqueles companheiros e companheiras, o espírito de auto-crítica, a disponibilidade para a transmissão da experiência são
exemplos que aprendemos com Nelson Xavier, com Augusto Boal, com César Vieira, com Iná Camargo Costa, e com tantas e tantos outros companheiros com que tivemos contato nos 11 anos de jornada da Brigada Nacional de Teatro do MST Patativa do Assaré.

Fortes abraços!
Rafael Villas Bôas
Brigada Nacional de Teatro do MST Patativa do Assaré
Brigada Semeadores, de agitprop do MST/DF
Professor de Teatro da Licenciatura em Educação do Campo da UnB

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