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domingo, 1 de junho de 2014

BOLETIM INFORMATIVO FÓRUM DE ARTE PÚBLICA DATA: 12 DE MAIO DE 2014


Amir abre o encontro e fala estar feliz em ver outros rostos que não sejam os mesmos que freqüentam e também feliz por ver aqueles que continuam nos encontros das segundas, mantendo o ritmo regular do Fórum em um momento importante em que não estamos envolvidos em nenhum evento e tendo pela frente uma reunião com o Prefeito Eduardo Paes para falar sobre o Projeto, que teve sua conclusão e entregar em mãos o relatório, fruto de três meses de intensa atividade do Arte Pública, Uma Política em Construção, pois como foi colocado por Amir: - "Temos que discutir a nossa continuidade, tem bastante coisa para fazer..."

Foi entregue uma edição simbólica ao Vereador Reimont na Cinelândia durante a Apoteose do I Festival Carioca de Arte Pública. Na ultima segunda, dia 05, cada curadoria ficou de fazer um levantamento dos subsídios, das necessidades que encontramos para o artista de rua realizar seu trabalho: Amir – "Temos que encaminhar uma proposta, um esboço de elaboração de políticas públicas para as Artes Públicas... Garantir políticas públicas e proporcionar locomoção dos grupos dentro da cidade e fora dela. Descobrir quais políticas públicas queremos e avançar no conceito Arte Pública."

 O encontro desta segunda foi marcada pela discussão sobre o que é um artista público, pois segundo alguns pontos levantados, até mesmo pela experiência e vivência no projeto realizado, só por está fazendo alguma atividade artística na rua, não quer dizer que seja um artista público e nem que esteja realizando uma Arte Pública. Muitos pontos foram levantados sobre essa questão e a relação do artista com o público que o assiste no espaço aberto, ainda mais que uma geração está indo direto para a rua fazer arte. Quando o artista que se apresenta na rua está aberto e em contato com a rua e se apresenta respeitando o público sem o agredir? Será que está tendo mesmo uma relação horizontal com a população? As indagações levaram a reflexões levantadas por Amir Haddad que nos levou a pensar ainda mais sobre a nossa prática. Amir fez uma sabatina que a cada apontamento se tornou uma tese sobre o artista público.

Amir : - Podemos nos perguntar: o que é um artista público? Será que todo artista de rua é público? A gente tem visto que não é assim. Você é um artista e quer se apresentar. Mas o que é um artista de rua? O que é um artista público? É só uma questão de geografia ou de responsabilidade e contato com a cidade? Ou é aquele que pensa o que está falando, sem contato com nada? Eu vou só por causa de mim? Quais os sentimentos que me levam para a rua? Basta estar na rua? O artista público é simplesmente aquele que se apresenta nos espaços públicos? Quais as responsabilidades que a gente exerce em contato direto com a população sem catraca, sem bilheteria e sem censura? Cada um faz o seu, enfrenta os entraves, as dificuldades... Quando o artista vai para a rua cria um código. O Geruza tem um código, tem uma maneira, tem uma sabedoria de como fazer isso, esse contato com a população. Tem a experiência. Geruza escolheu a rua. Nós escolhemos a rua. Não basta só o conceito de artista público, precisamos modificar a nossa consciência, nos aprofundar mais. Tivemos experiências contraditórias. Não dar para ir para a rua levando o espaço interno das salas... O teatro interno da década de 70 por vezes era agressivo na sua tentativa em modificar, buscar outros espaços, criar o alternativo... Tinha uma peça... O diretor tinha ódio por ter que trabalhar para a classe média e os atores da peça xingavam a platéia... O espetáculo era afrontar o público... O sentimento acaba virando o mesmo do teatro de Shopping...  Artistas que não colocam o espectador na sua lista de preocupações, devido a sua subjetividade, seu ego, coisa do artista pequeno burguês e que norteia os artistas das salas fechadas... Começam a ter problemas desse tipo... Essas associações... Vão para a rua com esse sentimento... Para a sociedade burguesa não interessa o que fazemos, descompromissada politicamente, com seu egocêntrismo, sua subjetividade, sua competividade... Na medicina é a mesma coisa: Formar o cidadão para a competição, sem nenhuma responsabilidade com a sociedade... A regra que predomina é farinha pouca, meu pirão primeiro... Para a lógica burguesa, sem competição não há desenvolvimento... Ter o melhor produto... Não basta ir para a rua fazer arte... Tem que olhar a rua... Tem que entender o que é esse artista público... Nenhum de nós foi preparado. Fizemos a nossa escolha... Historicamente o que mudou muito foram 300 anos de contato direto com a burguesia. O teatro passou a ser feito em um lugar só, fechado, e imediatamente se tornou homogêneo... Desde 1800 até agora nós representamos para esse público... Hoje no Brasil vai se percebendo a diferença... A platéia não é um corpo passivo, está trabalhando com você... A comédia Dell'rte durou 250 anos... Molieré bebeu nessa fonte... Fazia seu teatro tanto nos palácios como nas ruas, tanto que ele não pertencia a Academia de Letras, porque era histriônico, grosseiro... Carlos Goldoni leva o teatro para o espaço fechado... Com isso foi mudando a linguagem, as máscaras caíram. Os atores da rua foram coletados para o palco... Os atores passam a não falar em versos, passam a falar em prosa... A prosa elimina a idéia, a poesia é uma forma popular, do teatro popular que Lorca fazia... A transfiguração desaparece... Você tem que gesticular igual, ter boa representação. Não pode olhar para a platéia, tem que falar a parte, olhar para o lado, nasce a quarta parede. A sala aparece... O pensamento pragmático da burguesia, que lida com o dinheiro e o povo com o trabalho, que sai para pegar a produção e vende na cidade (O atravessador que coloca o seu preço com margem de substancial de lucro) vem para o Teatro... Quem pode paga... Esse teatro tem 300 anos ou mais, é muito tempo... O teatro espanhol teve 190 anos, como o Teatro Elisabetano teve o seu tempo... 300 anos é muito tempo para este teatro e para qualquer outro teatro ou expressão artística... O contato e a relação que criamos com o público é importante... Da mesma maneira que modificamos, somos modificados por essa platéia... Modifica na relação de espetáculo e de artista. Tem essa troca... Para o teatro burguês não... O teatro tem que ser de uma maneira, como se os valores fossem eternos... Há uma enchente de peças bem feitas, onde tem a questão da bilheteria... Meus atores do Tá Na Rua sofrem muito com isso, por não serem esses atores do mercado. No teatro que fazemos não tem dramaturgia, não tem estatística, não tem ética. O que é ético é bonito, o que é substantivo, é coisa legal...  Quais os avanços sem estar preso a uma estética? Eu fui com o Alessandro assistir uma peça: "Doze Homens e Uma Sentença"... É uma peça onde um rapaz latino é acusado de um assassinato e tem o júri formado por esses doze homens... Onze deles estão prontos para condenar o rapaz quando um levanta e fala: "Não acho que é inocente, mas não tenho certeza se é culpado..." Ai a trama se desenrola... Eu quero dizer que é bem feito. Conversando com o Alessandro ele fala: "- Rapaz... Me fez pensar. Esse teatro é tudo que não fazemos."... E é isso mesmo. Nós não fazemos esse teatro bem feito... Com dramaturgia para o entretenimento... O teatro está morto, viva o teatro... O Brecht é a forma de teatro que chega perto do que a gente faz hoje, a narração épica... Na primeira revolução socialista, se fazia teatro nas ruas, nas boutiques, era o teatro de Maiakoski, de Meyerhold até que vem o neoliberalismo stanilista e acaba com tudo... Passa a valer o que é oficial do Estado, fica o realismo socialista... Matou maiakoski... Matou Meyerhold... O realismo é base do teatro da burguesia... Herdamos isso... Saímos do palco... Esse teatro se encontra agonizante, terminal... Dizem que é eterno, que na ideologia de cada grupo é eterno, não vai mudar... A história movimenta... Quando a União soviética caiu, os pensadores diziam "a história acabou, não tem mais história"... A história continua, a história modifica, modifica a platéia e a platéia modifica a gente, ficamos de outra forma, temos outra forma de relacionamento. Delicias e agruras da rua... O que é um artista de rua? Qual a diferença entre o comediante e o artista de rua? Desde a idade média os comediantes faziam jograis, músicas. Não tinha dialogo. Não falavam: "Eu vou fazer a mocinha"... Tinham uma linguagem. Nasceram na rua e desenvolveram o teatro. Já existiam... Se fecham depois no palco, mas eles são antes... A comédia Dell'rte do Geruza tem a noção, coisa que as vezes e muitas vezes não temos. Nós saímos do palco para a rua... Fomos atrás da Liberdade Perdida... A diferença, só com o seu ego, já faz a gente pensar: Qual o nosso papel e o que levar para esse público? A vida cultural do planeta tem que mudar. Shakespeare escreveu para um mundo que estava acabando. Acabou tudo, veio outro teatro. Trabalhava com recursos de um mundo em modificação. Nós estamos vivendo uma passagem... Não sei o que vem por ai... Fico refletindo: O que é o artista público em relação com o mundo? Quem somos nós? Artistas públicos ou artistas que se apresentam? Eu sou livre? Qual é o respeito? O que se compartilha, o que se soma? Nosso pensamento é ancestral, contemporâneo. Somos a possibilidade das ruínas deste mundo em derrocada. Somos o passado, o presente e o futuro possível. Só se faz o futuro no presente."

Ao final, seu Noberto tocou sua clarineta, brindando a conclusão do fórum deste dia com as maravilhosas notas do "Carinhoso".
Com sempre termino, este é um boletim informativo, não é relatório e nem ata. Escrevo a partir das minhas anotações e está aberto para correções, acréscimos e opiniões. Mas vale ressaltar que este nem foi um boletim, mas uma reflexão e história sobre o artista público. Talvez tenha sido o mais difícil de escrever devido á riqueza do pensamento levantado.

Ass:
Herculano Dias

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