A jornada
antes do Evento Ocupa Nise 2014 ainda teve uma parada, Londrina, onde aconteceu
o XIV Encontro da Rede Brasileira de Teatro de Rua. Mas antes do Paraná, interlúdio
no Rio de Janeiro.
Antes do
encontro em Londrina, o Fórum de Arte Pública, junto com representantes da
Universidade Popular de Arte e Ciência. Conversamos sobre a possibilidade de
confirmar ou não o Encontro da RBTR na cidade do Rio de Janeiro. Quais as
dificuldades, quando e onde. Seria interessante? Afinal era uma idéia que tinha
nascido no encontro do Ocupa Nise 2013 e proposto por articuladores da RBTR que
estavam no evento. Avaliamos que seria
muito bom que o Rio pudesse sediar o XV Encontro, principalmente sendo
realizado dentro do Instituo Nise da Silveira, na Zona Norte da cidade, no
espaço do Hotel da Loucura. Concordamos que sim, confirmaríamos o Rio no
encontro em Londrina. E iríamos como delegação, com seis representantes, para
sancionar o XV Encontro da RBTR, junto com o 4° Congresso da UPAC, em setembro,
de 01 á 07, no 3° Ocupa Nise, ano de 2014.
Londrina – XIV Encontro
Paraná,
cidade de Londrina. Segundo a história, Sir Simon Joseph Fraser, mais conhecido
como Lord Lovat, quando veio ao Brasil e visitou o norte do Paraná, ficou
encantado com a região. Com outros companheiros ingleses, fundou a Companhia de
Terras do Paraná. Ao observarem a névoa característica da mata, viram semelhanças
com a neblina da cidade de Londres. Para homenagear a capital da Inglaterra,
batizaram o lugar de Londrina.
A cidade já
foi a Capital do café e é a casa do famoso Tubarão, o Londrina esporte Clube,
um dos mais tradicionais clubes brasileiros.
Ficamos alojados
em um retiro afastado da cidade. Um local bem aconchegante e calmo. Muitos
articuladores não puderam vir ao encontro e cancelaram a sua ida para Londrina,
alguns em cima da hora. Apesar desse fator, o encontro no Paraná foi muito bom.
O começo não
poderia ter sido melhor. A abertura se deu no Sesc poderia ter sido
convencional, com as pessoas se deslocando para o auditório, sentando em suas
cadeiras enfileiradas enquanto o palestrante ficaria em cima do palco, falando
e atendendo pergunta. Não aconteceu nada disso, primeiro fizemos uma
concentração em frente a porta da instituição. Roda formada, Humberto, mestre
do cavalo marinho comandando a musicalidade regada a xote, forró e samba e com
muita dança na ponta do pé. Foi com ritual e celebração, com dança, música (por
que não falar: suco de cevada dos deuses do bar), que penetramos no prédio do
Sesc, subindo as escadas em cortejo. Na frente, Daniel e Alexandre rodavam as
suas saias, conduzindo a trupe até o local da palestra de abertura falando
sobre Arte Pública. E foi dançando que entramos no auditório, onde sob
desmontamos o convencional e formamos uma roda para dialogar com o Mestre Amir
Haddad sobre o tema proposto.
No dia
seguinte, no sitio onde o encontro estava sendo hospedado, iniciamos, antes dos
relatos dos estados, com um pequeno vídeo, uma pílula, sobre o I Festival
Carioca de Arte Pública, mas focado na Praça Tiradentes onde o Tá Na Rua era o
grupo anfitrião. Muitos se emocionaram com o depoimento da Aquimi, nossa menina
que coloca seu nome em um grão de arroz, falando que “ela não estava mais
sozinha”. Foi bom, pois foi um bom dia onde o dialogo fluiu muito bem, com os
relatos, com a poesia proferida pelo bom Daniel e pelos tambores de macumba que
ecoaram dentro das paredes do sitio. A sala virou um terreiro, onde os
pilintras deram pinta e as pombas giras rodaram suas saias. Foi nesta
celebração, com a presença de Amir Hdaddad e de Vitor Pordeus, mentor do hotel
da Loucura, que confirmamos o Rio como sede do próximo encontro da Rede, dentro
do evento Ocupa Nise.
Fiquei
pensando muito sobre isso, o fluir do movimento, sem determinar o movimento, o
mesmo que acontece conosco quando estamos na rua nos apresentando, seguindo os
acontecimentos. É uma questão que levantamos nas rodas, quando é que a rua
entra no teatro de rua?
E tivemos exemplos disso, quando assistimos as
apresentações na Praça Floriano Peixoto, onde os moradores de rua entravam,
falando e dançando. Era o fluxo da rua trocando e sendo organizado pelos
espetáculos. Ignorar era uma influência negativa na apresentação. E como eles
tem a aprender, como ensinar. Como não dá para ficar preso a determinadas
regras, sem flexibilidade.
Essas
questões ficaram na minha cabeça, inda mais quando tivemos uma vivência forte
com o Sergio, paulista perdido nas esquinas de Londrina. Humilde em tudo e que
participou com desenvoltura do espetáculo apresentado pelo grupo Rococoz, de
São Paulo, depois tocando com o Pedro, músico local e finalizando com uma
apresentação solo, tocando guitarra e cantando “Ouro de Tolo” do Raul Seixas,
com desenvoltura e, o mais importante, com vida. Ao final, até os guardas da
praça, que estavam implicando com sua caixa de sapatos e sua flauta de
brinquedo, contribuíram com o chapéu que passamos para ele. O mendigo de
inicio, encurvado, foi perdendo o fedor, o bafo, ficou perfumado, tirou o
casaco escuro, ficou de camisa colorida, ficou ereto e fez a guarda municipal
chorar com emoção. Isso tem um significado muito forte, pois se apresentar na
rua não que dizer que esteja vendo o seu movimento. O chapéu do Sergio foi tão
bom, que ele comprou comida com seus parceiros da praça e ainda teve um convite
de trabalho, com o contratante se dispondo a resgatar toda a documentação que
ele havia perdido. Este momento está melhor transcrito em outro artigo que
breve estará degustado pela literatura.
Mas como é
bom isso, como é bom para a saúde de uma cidade ter uma arte pública em
movimento, atuando nos espaços públicos. Como é bom é bom entrar na secretária
municipal de cultura tocando os tambores e os funcionários dançarem com o nosso
ritmo. Como é bom ver a secretária de cultura entrar na roda e dançar com os
artistas. É protesto na sua melhor função, como proposta, sem ser um protesto.
Esses
exemplos são a melhor maneira que pude encontrar para primeiro falar como foi
importante o movimento que o encontro tomou em Londrina para dar uma melhor
dimensão e harmonia entre celebração, apresentação e dialogo dentro de um
encontro, com identidade e com sua forma de realizar uma plenária, sem o peso
de ser uma plenária. Terminamos bem o encontro com um cortejo pelas ruas do
centro da cidade, com a população nos parabenizando pelo colorido da tarde. Do
alto Rogério declamava com destreza teatral a carta de Londrina.
Sabemos que
não é fácil conduzir uma produção, mas o pessoal do MARL – Movimento de
artistas de Rua de Londrina – fez um belo trabalho, onde fomos bem amparados,
alojados e alimentados. Bato palmas para eles. Valeu Londrina.
Próxima
parada, Rio de Janeiro.
NOSSA SENHORA DE
LONDRINA
Destacada na
parte oeste da Praça Floriano Peixoto, fica uma imagem de uma santa, mas não
qualquer santa, é Nossa Senhora, extática, linda imponente com sua coroa
dourada e seu manto branco e... vermelho. Estamos tão acostumados com a imagem
de Maria com um manto azul que muitas vezes não ponderamos que ela pode se
vestir com outras cores. Só a identifiquei pelo menino Jesus que tão carinhosamente
segurava perto do coração. Coração de mãe. Coração bordado em vermelho e
dourado, sem nenhuma faca atravessando o nobre músculo, símbolo da vida, de
sangue e do amor. Curioso, me aproximei. Era uma estátua diferente. Do nada, ela
se movimenta e como mágica, das mãos do menino Jesus brota um minúsculo papiro,
do tamanho de um grão de bico, no formato de um rolo e fechado por uma fitinha
fina vermelha. Desenrolo o pequenino pergaminho e leio o seu conteúdo: “Vivo
nas Estrelas porque é lá que vive minha Alma – Manoel Bandeira.”
Encantado
com a destreza e a beleza tanto da frase, como do gesto, dos movimentos em
total sintonia e destreza, deslizei pelo pequeno altar montado em sua frente um
pequeno donativo em oferenda ao presente recebido. A Santa encurva-se um pouco
em agradecimento e modificando sua posição, coloca o menino em outra posição,
mas a frente, do jeito como a mão eleva o filho para apresentá-lo ao mundo,
voltando a sua inércia. A mais bela imagem que encontrei pelas ruas de Londrina,
uma Santa Viva.
Herculano Dias
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