Relato sobre a ação da Guarda Civil Metropolitana, em conjunto com a Subprefeitura da Sé
Nós, integrantes do grupo de teatro Companhia Auto-Retrato, presenciamos às 10hs da manhã do dia 12 de abril de 2012, na Praça da Sé, um conjunto formado por Guardas Civis Metropolitanos (GCM) e funcionários da Subprefeitura da Sé promovendo a apreensão de objetos pessoais de algumas das pessoas que ali estavam: sacos, sacolas, bolsas, roupas. Aparentemente, o critério para a tomada dos objetos, das mãos de seus donos, era o fato destes pertencerem a pessoas que supostamente não têm residência.
Diante da resistência por parte dos donos dos objetos, houve resposta truculenta da GCM, que deu continuidade à ação ao lado de uma equipe uniformizada da Subprefeitura da Sé, munida de luvas e máscaras.
Quando questionado por um dos integrantes da Companhia, o comandante da ação, que se apresentou como Sérgio, alegou que o procedimento fazia parte de um contexto maior de ações coordenadas pela prefeitura, e citou o exemplo da Polícia Militar, que estava encarregada de retirar os objetos guardados nas bocas de lobo, dentro de um processo de "limpeza da cidade". Reiteramos que testemunhamos objetos sendo retirados sobretudo das mãos das pessoas, e não apenas objetos dispostos no chão ou dentro de bueiros. Nos parece claro que a questão não se refere à limpeza física dos bueiros ou do passeio público, e sim a um processo consciente de gentrificação. À resposta evasiva do comandante, somou-se sua orientação para que procurássemos a Subprefeitura da Sé para esclarecimentos sobre o decreto que estabelece esse procedimento.
Em menos de dez minutos, dois caminhões foram plenamente abastecidos com objetos pessoais. Mesmo sob protestos de moradores de rua e demais munícipes que, de passagem, se mostravam abismados com a natureza e com a violência da ação, os funcionários da Subprefeitura e da GCM não nos informaram com precisão qual seria o destino dos objetos apreendidos. A resposta foi, mais uma vez, evasiva. Na conversa que tivemos com os Guardas Civis e com pessoas que estavam na praça fomos informados de que essa ação acontece frequentemente, em dias e horários alternados, em vários espaços públicos do centro da cidade de São Pa ulo.
Dois dos integrantes da Companhia, seguindo as orientações da GCM, foram à Subprefeitura da Sé. Conduzidos por diversos setores diferentes, obtiveram a informação de que o responsável pelo procedimento não se encontrava no prédio. Eles chegaram, então, à assessoria jurídica, onde foram informados da existência do Decreto 50448, de 2009, que define como função das Subprefeituras e da GCM garantir a possibilidade de livre circulação no espaço público e fornecer assistência social (esse decreto e suas posteriores alterações estão disponíveis na internet: http://www3.prefeitura.sp.gov. br/cadlem/secretarias/ negocios_juridicos/cadlem/ integra.asp?alt=26022009D% 20504480000) [1].
O procedimento correto, segundo o assessor jurídico, seria o encaminhamento dos moradores de rua para abrigos e, seus pertences, guardados em embalagens lacradas – cujos contralacres seriam entregues aos proprietários, para que pudessem retirá-los no lugar onde fossem armazenados.
Independentemente da discussão que se pode fazer a respeito do teor do decreto, o que testemunhamos claramente não corresponde ao seu conteúdo. Os objetos pessoais eram simplesmente jogados nos caminhões e não eram dadas, aos seus donos, informações de se e como eles poderiam ser recuperados. A opinião geral de quem acompanhou a ação era de que tudo aquilo seria jogado em algum lixão.
Nós, da Companhia Auto-Retrato, acreditamos que essa ação corresponde a uma grave violação aos direitos dos cidadãos anônimos que estavam na praça, que tiveram seus bens confiscados sem qualquer justificativa nem possibilidade de defesa. Tão inquietante quanto isso é a questão que fica: que critérios serviram de fundamento para a escolha das pessoas que tiveram seus bens confiscados?
Companhia Auto-Retrato
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário